23 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Folha: Bolsonaros usaram dinheiro vivo para sustentar campanhas eleitorais

Presidente e seus filhos injetaram R$ 100 mil em campanhas de 2008 a 2014; família já movimentou mais de R$ 3 milhões em espécie

Os filhos Carlos, Flavio e Eduardo Bolsonaro, com o pai presidente, Jair Bolsonaro, em uma simplicidade que não condiz com a fortuna movimentada em dinheiro vivo

O presidente Jair Bolsonaro e seus filhos fizeram doações em dinheiro vivo para alimentar suas campanhas eleitorais de 2008 a 2014. No total, foram injetados R$ 100 mil em espécie, ou R$ 163 mil se corrigidos pela inflação.

Eles faziam isso por meio de autodoações em dinheiro vivo e de depósitos em espécie feitos por um membro da família em favor de outro. Em duas candidaturas, a utilização de cédulas foi responsável por cerca de 60% da arrecadação da campanha.

O uso frequente de dinheiro vivo no financiamento eleitoral repete hábito da família de pagar contas pessoais e até a quitação de imóveis em espécie, costume atualmente investigado no chamado caso das “rachadinhas” na Assembleia Legislativa do Rio.

Transações em espécie não configuram crime, mas podem ter como objetivo dificultar o rastreamento da origem de valores obtidos ilegalmente.

Hoje, esse tipo de movimentação é comunicada automaticamente ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) quando ultrapassa R$ 10 mil.

Análise da Folha

Os depósitos em dinheiro vivo para o financiamento de campanha foram identificados pela Folha nos processos físicos das prestações de contas entregues à Justiça Eleitoral.

A reportagem analisou os recursos recebidos desde 2000 pelas campanhas de Jair Bolsonaro (sem partido) e seus filhos, Flávio (Republicanos-RJ), Carlos (Republicanos-RJ) e Eduardo (PSL-SP).

Nas 5 campanhas em que a reportagem identificou pagamentos em espécie, o percentual de financiamento desse tipo em relação ao total de recursos arrecadados variou de 1% a 58%.

Das 13 candidaturas analisadas, em 4 não houve depósitos em dinheiro vivo. Em outras 4, não foi possível confirmar pelas prestações se houve injeções em espécie.

O elevado uso de dinheiro vivo nas campanhas destoa da prática de outras candidaturas bem-sucedidas naqueles anos.

R$ 3 milhões em dinheiro vivo

Reportagens e dados obtidos por órgãos de investigação mostraram que a família Bolsonaro, especialmente na figura do senador Flávio Bolsonaro, já movimentou mais de R$ 3 milhões em dinheiro vivo nos últimos 25 anos.

Entre as operações em espécie, segundo as apurações, estão a compra de imóveis, a quitação de boletos de planos de saúde e da escola das filhas de Flávio, o pagamento de dívidas com uma corretora e depósitos nas contas da loja da Kopenhagen da qual o senador é dono.

O Ministério Público do Rio de Janeiro suspeita que o filho mais velho do presidente tenha utilizado recursos obtidos com o suposto esquema de devolução de salários em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa para permitir essas operações em benefício pessoal.

Outro lado

A assessoria da Presidência da República informou que não comentaria a utilização de dinheiro em espécie em campanhas de Jair Bolsonaro e dos filhos. A reportagem procurou outros os três filhos do presidente, mas não obteve resposta até a conclusão deste texto.

Em relação às movimentações de dinheiro em espécie, em ocasiões anteriores a família Bolsonaro negou que elas representassem indícios de ilegalidades.

A defesa de Flávio Bolsonaro, por exemplo, disse em julho, ao comentar depósito de R$ 25 mil feito por Queiroz na conta da mulher do senador, que não houve nenhuma irregularidade.