O presidente Jair Bolsonaro e seus filhos fizeram doações em dinheiro vivo para alimentar suas campanhas eleitorais de 2008 a 2014. No total, foram injetados R$ 100 mil em espécie, ou R$ 163 mil se corrigidos pela inflação.
Eles faziam isso por meio de autodoações em dinheiro vivo e de depósitos em espécie feitos por um membro da família em favor de outro. Em duas candidaturas, a utilização de cédulas foi responsável por cerca de 60% da arrecadação da campanha.
O uso frequente de dinheiro vivo no financiamento eleitoral repete hábito da família de pagar contas pessoais e até a quitação de imóveis em espécie, costume atualmente investigado no chamado caso das “rachadinhas” na Assembleia Legislativa do Rio.
Transações em espécie não configuram crime, mas podem ter como objetivo dificultar o rastreamento da origem de valores obtidos ilegalmente.
Hoje, esse tipo de movimentação é comunicada automaticamente ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) quando ultrapassa R$ 10 mil.
Análise da Folha
Os depósitos em dinheiro vivo para o financiamento de campanha foram identificados pela Folha nos processos físicos das prestações de contas entregues à Justiça Eleitoral.
A reportagem analisou os recursos recebidos desde 2000 pelas campanhas de Jair Bolsonaro (sem partido) e seus filhos, Flávio (Republicanos-RJ), Carlos (Republicanos-RJ) e Eduardo (PSL-SP).
Nas 5 campanhas em que a reportagem identificou pagamentos em espécie, o percentual de financiamento desse tipo em relação ao total de recursos arrecadados variou de 1% a 58%.
Das 13 candidaturas analisadas, em 4 não houve depósitos em dinheiro vivo. Em outras 4, não foi possível confirmar pelas prestações se houve injeções em espécie.
O elevado uso de dinheiro vivo nas campanhas destoa da prática de outras candidaturas bem-sucedidas naqueles anos.
R$ 3 milhões em dinheiro vivo
Reportagens e dados obtidos por órgãos de investigação mostraram que a família Bolsonaro, especialmente na figura do senador Flávio Bolsonaro, já movimentou mais de R$ 3 milhões em dinheiro vivo nos últimos 25 anos.
Entre as operações em espécie, segundo as apurações, estão a compra de imóveis, a quitação de boletos de planos de saúde e da escola das filhas de Flávio, o pagamento de dívidas com uma corretora e depósitos nas contas da loja da Kopenhagen da qual o senador é dono.
O Ministério Público do Rio de Janeiro suspeita que o filho mais velho do presidente tenha utilizado recursos obtidos com o suposto esquema de devolução de salários em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa para permitir essas operações em benefício pessoal.
Outro lado
A assessoria da Presidência da República informou que não comentaria a utilização de dinheiro em espécie em campanhas de Jair Bolsonaro e dos filhos. A reportagem procurou outros os três filhos do presidente, mas não obteve resposta até a conclusão deste texto.
Em relação às movimentações de dinheiro em espécie, em ocasiões anteriores a família Bolsonaro negou que elas representassem indícios de ilegalidades.
A defesa de Flávio Bolsonaro, por exemplo, disse em julho, ao comentar depósito de R$ 25 mil feito por Queiroz na conta da mulher do senador, que não houve nenhuma irregularidade.