24 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

“Líder Supremo”, Bolsonaro convida toda linha sucessória para desfile de tanques

Arthur Lira diz ser ‘coincidência trágica’ o ato militar durante votação de PEC, que tem ainda os fãs do presidente ‘autorizando o uso’ da força

O presidente Jair Bolsonaro já sabe que vai perder, no Congresso, sua luta pelo voto impresso. Arthur Lira, presidente da Câmara, já explicou que a PEC não passará em votação dos deputados.

Como esta seria sua última chance (ou desculpa) para ter alguma chance nas próximas eleições, Bolsonaro foi além: no mesmo dia da votação da PEC, participará de um desfile com um comboio de veículos blindados, incluindo tanques de guerra e lança-mísseis.

E para essa demonstração de força e poderio militar, num momento em que até o aliado Lira considerou uma ‘coincidência trágica’, o presidente convidou presidentes de outros poderes, em sua maioria rivais políticos, para o desfile.

A postagem tosca no Facebook, com a imagem de um print da galeria de fotos do presidente (tirada às 21h17, com pouco mais da metade da bateria do celular) não cita nominalmente ninguém. Mas faz o convite aos presidentes do STF, Câmara e Senado – simplesmente sua linha sucessória – assim como as presidências de Tribunais, mas deputados e senadores.

Na mesma postagem, os fãs do ‘lider supremo’ se dizem ansiosos com o ato. Pedem que os canhões sejam mirados para o STF. Autorizam o uso da força contra os rivais políticos. Não raro, usam o meme de Ronaldinho Gaúcho com a frase ‘estão deixando a gente sonhar’.

Sonho ou pesadelo, o fato é que o presidente que nega a pandemia e trocou cloroquina pelo voto impresso em seu discurso reacionário, quer toda sua linha sucessória ao seu lado, durante um desfile militar com tanques blindados. No mesmo dia em que sairá derrotado no Congresso.

Não é preciso nem mesmo um dedo nervoso no gatilho. Nesta situação, basta um deslize no diálogo, uma fala mais acalorada, para a situação escancarar o perigo democrático que vivemos. E olhe que há quem torça pra isso.

Reações

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e a deputada federal Tabata Amaral (sem partido) impetraram uma ação popular para tentar impedir o ato. Além disso, o PSOL também entrou com um mandado de segurança com o mesmo objetivo.

Nas redes sociais, o senador e vice-presidente da CPI da Covid, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que colocar tanques nas ruas é uma “demonstração de covardia” de Bolsonaro.

O ex-presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, comparou o ato do político brasileiro ao do ex-presidente do Peru, Alberto Fujimori, e ressaltou que, no caso do peruano, ele acabou preso.

Já o vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM) disse que o evento não causa medo nos parlamentares e afirmou que votará contra o projeto defendido pelo governo.

Marinha, em nota, tentou minimizar o desgaste gerado com outras Forças e também no meio político, e afirmou que o ato “simbólico” não tem relação com o projeto do voto impresso.

Já uma nota em repúdio ao desfile militar foi assinada por PT, PSB, PC do B, PDT, REDE, PSOL, PSTU e Solidariedade:

“Um comunicado oficial do Ministério da Marinha anunciou a realização de um desfile de blindados, acompanhado de sobrevoos pela Esplanada, em Brasília, nesta terça-feira, tendo como destino o Palácio do Planalto.

O motivo alegado é marcar a entrega a Bolsonaro e ao ministro Walter Braga Netto (Defesa) de um convite para que as autoridades acompanhem um tradicional exercício da Marinha previsto para 16 de agosto, em Formosa (GO).

Em meio às sucessivas declarações golpistas de Bolsonaro, e da votação do projeto do “voto impresso” nesta mesma terça-feira, com previsão de derrota, o desfile é uma clara tentativa de constrangimento ao Congresso Nacional.

Estranhamente, e diferente das edições anteriores, é a primeira vez que o convite é feito com um ostensivo e desnecessário desfile de blindados militares, injustificável e reprovável por várias razões de interesse sanitário público.

Neste momento em que o Brasil acumula a trágica marca de quase 600 mil mortes, não tem sentido expor pessoas, inclusive os militares, promover aglomeração e gastar recursos públicos com tal atividade.

É inaceitável, ainda, que as Forças Armadas permitam que sua imagem seja exposta desta maneira, usada para sugerir o uso de força em apoio à proposta antidemocrática e de caráter golpista, defendida pelo presidente da República.

O Brasil ainda está em guerra contra o coronavírus, embate agravado pela variante Delta, pelo desemprego e pela fome, o que exige de toda a sociedade compromisso com a defesa dos verdadeiros interesses dos brasileiros.

O povo não quer ver desfile de tanques de guerra, quer vacina no braço, respeito à democracia e instituições e governantes que trabalhem para gerar empregos e para acabar com a fome no país”.