19 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
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Mamão: um doce de pessoa

Mamão é cria de uma família tradicional em Alagoas. Pensou em ser político. O caminho mais fácil para ter fazendas, bois no pasto, jatinhos e muito dinheiro pelos bancos daqui e de além mar. Nascido em Bebedouro tentou com o pai, um panificador respeitado, o vil metal para a campanha. Mas, dele ouviu a severa recomendação de que fosse estudar ou procurar um ‘lavado de roupa’.

Segundo Considerado, fofoqueiro de plantão, sem o apoio necessário, morreu aí o projeto de Mamão ser um político influente em terras alagoanas.

O problema é que ele não levava muito jeito para pegar no pesado. Em algo mais leve só tivesse estudado como o irmão doutor, primeiro aluno da faculdade de medicina, orgulho dos pais e hoje da sogra.

Ainda assim, a família arranjou um emprego para Mamão no Produban. Esse negócio de ser caixa, contar dinheiro sem seu e aguentar mau humor de cliente na fila não era muito com ele. Que fez? Desistiu da vida de bancário.

Rondando as ruas da cidade, galanteador, gostava mesmo de namorar. Mas, sem dinheiro para tomar o velho e bom sorvete da Gut Gut o cara não ia para lugar nenhum. Logo, o namoro terminava.

Com o bom relacionamento que tinha, a família arranjou-lhe um emprego na Salgema. Foi ser segurança da fábrica. Homenzarrão forte, tinha todo o biotipo para o serviço. Não demorou muito e chega em casa meio triste. A mãe o abraça e pergunta: – O que há meu filho, tudo bem? – Mais ou menos mãe.

Ficou pelos cantos e a mãe insistiu para que lhe contasse logo o que estava havendo. Tinha receio que ele tivesse aprontado alguma coisa no emprego ou ‘feito mal’ a filha de algum figurão da cidade. Assim, ela deixou o que estava fazendo, sentou-se com ele e iniciou a conversa:

– Diga-me logo filho, o que se passa?

– Sabe o que é mãe, eu estou cansado.

– Trabalhando demais é meu menino?

– Muito mesmo, mãe.

– Mas o trabalho dignifica o homem.

– Se for na sombra, mas do jeito que eu vivo…

– E como é que você vive?

– O dia inteiro no sol.

– Meu Deus, então saia logo desse trabalho. Isso não é pra você.

Era o que ele queria. Com o aval da mãe inocente pode voltar a bater pernas pelas ruas sem preocupação nenhuma. Certo dia encontrou-se com amigos no bar Grutinha e tomou umas cervejas só no zero oitocentos. A turma resolveu sair e encerrar a farra no bar do Lula. Mamão pega um táxi e segue também. A corrida deu dez reais. Só tinha cinco. Deu o dinheiro e o taxista reagiu: – São dez, amigo. – Eu pedi um táxi para mim e você fez a viagem comigo, então vamos dividir, ‘metá-metá’. – Tem nada de ‘metá-metá’ não. Protestou o motorista enquanto ele saía do veículo.

Sabendo que ele era filho do panificador, o taxista acabou cobrando o que faltava na padaria. Foi aí que a mãe percebeu que o filho precisava voltar a trabalhar. De novo um amigo da família arranjou-lhe uma vaga de vigilante do Parque das Flores. Lá passou 15 dias.

Chegou outra vez em casa, ficou pelos cantos até que a mãe o descobriu e quis saber novamente qual o problema?

– O que foi agora filhinho?

– Esse emprego, mãe, é muito ruim.

– Mas ali é um lugar tranquilo…

– Esse é o problema mãe.

– Não entendi.

– É que lá é um silêncio…

– Meu filho você é um doce de pessoa, mas desse jeito quem vai entrar em silêncio eterno sou eu.

 

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