A mais polarizada e polêmica eleição presidencial da história recente dos Estados Unidos acontece nesta terça-feira (3).
De um lado o atual presidente, Donal Trump, o homem que popularizou o termo fake news e já deixou claro que não aceitará outro resultado que não sua vitória. Do outro Joe Biden, ex-vice de Obama, o escolhido dos democratas para fazer o oposto de Trump na Casa Branca. E isso afeta diretamente o Brasil de Bolsonaro.
O ambiente nos EUA é péssimo. A rede de lojas Walmart retirou armas e munições de suas estantes. Janelas de cafés e restaurantes estão cobertas por tapumes. Universidades chegaram a recomendar que seus alunos estoquem comida suficiente para uma semana. E o patrulhamento policial será incrementado em um pleito que, tudo indica, não terminará de forma sadia.
Grupos radicais podem comparecer armados às urnas para intimidar eleitores. Além disso, milícias pode se recusar a aceitar uma eventual derrota do republicano Donald Trump e marchar nas ruas do país. Curiosamente, o país que se diz o berço e bússola moral da democracia no mundo, está com a sua em risco.
E é difícil rejeitar que isso não seja culpa do atual presidente: Trump se recusou a condenar os extremistas Proud Boys (garotos orgulhosos). Os paramilitares Oath Keepers (guardiões do juramento) também preocupam analistas de segurança. Algumas dessas facções radicais afirmam acreditar que uma nova guerra civil. Não só isso, esperam ansiosamente pelo conflito.
Autoridades recentemente desvelaram planos para sequestrar Gretchen Whitmer, governadora de Michigan, e Ralph Northam, governador da Virgínia. Ambos são democratas.
Como lá o porte de armas é permitido, grupos armados falam abertamente em ir às urnas para fazer o que eles chamam de “monitoramento” e que especialistas dizem ser uma clara tentativa de intimidação. Segundo o jornal Washington Post, americanos já compraram 18 milhões de armas em 2020. No estado de Michigan, as vendas triplicaram em comparação com 2019.
Trump não aceitaria derrota
Donaldo Trump, além de se recusar a condenar os movimentos radicais e racistas que o apoiam, promete levar até as últimas consequências uma derrota nas urnas.
Além de pedir que seus eleitores fossem às urnas monitorar o voto, o republicano coloca em dúvida a credibilidade do processo eleitoral americano. Ele já afirmou, durante comício, que os democratas só venceriam roubando. O que motiva grupos radicais a esperar fraudes e, no caso de derrota, refutar os resultados oficiais do pleito.
Se fazendo de desentendido, Trump, contesta essa interpretação. Quando questionado sobre o tema, faz questão de dizer que o risco real vem de grupos de esquerda como o movimento Black Lives Matter (vidas negras importam) ou o Antifa.
Donald Trump inclusive planeja declarar vitória nas eleições presidenciais dos Estados Unidos na noite da próxima terça-feira, mesmo que o resultado final ainda dependa de milhões de votos não contabilizados em vários estados do país.
Segundo o site americano “Axios”, o presidente tem conversado com pessoas próximas sobre seu plano de anunciar publicamente que venceu a eleição para depois contestar nos tribunais a contagem de votos enviados pelo correio.
E o Brasil?
O presidente Jair Bolsonaro, literalmente, já disse amar Donald Trump e de coração torce pela reeleição de seu ídolo. Não é de se imaginar, toda a política externa brasileira depende da reeleição do republicano. E de uma forma ou de outra, o Brasil tem muito a perder, não importa o resultado.
Vinícius Rodrigues Vieira, doutor em Relações Internacionais por Oxford e professor na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e na pós-graduação da FGV, enxerga quatro cenários:
Biden vence, e isola Bolsonaro, que se une a outros populistas de direita
Com uma agenda ambiciosa em meio ambiente e direitos humanos, retomando relações com Alemanha e França, Biden ajuda a enterrar de vez o acordo Mercosul-União Europeia. Sem os EUA do lado, Bolsonaro radicaliza e ocupa o lugar de Trump como maior voz do populismo de direita no mundo.
Os aliados? Governos autoritários de cunho religioso, seja no Oriente Médio, seja na Europa Oriental, em especial a Hungria de Viktor Orbán. Economicamente, nos tornamos ainda mais dependentes da China, que com a clara opção de mercados fornecedores alternativos, empobrece o Brasil, de vez uma pária internacional.
Nossa política externa se aprofunda em pautas estranhas a nossa história, como a defesa de valores supostamente cristãos e distanciamento do Sul Global democrático, como ficou evidente quando recusamos a nos juntar a África de Sul e Índia para defender a quebra de patentes em vacinas. Tempos estranhos em que o Brasil seria reconhecido, internacionalmente, como um antagonista.
Biden vence e ignora Bolsonaro
Sem Trump do lado, Bolsonaro precisa buscar laços com a China e Índia pela sobrevivência de seu governo e dos negócios políticos de sua família. Com a ameação de sofrer sanções internacionais, Bolsonaro vira o melhor amigo de Xi Jinping para tirar a economia brasileira do buraco e saciar a sanha do Centrão por recursos.
Isso, claro, implicaria num rompimento com os bolsonaristas, a remoção de Ernesto Araújo da cadeira de Rio Branco e a concessão de mais espaço no Itamaraty a liberais econômicos de fato. Desde Geisel, o Brasil naõ teria uma política externa tão pragmática e distanciada dos Estados Unidos.
Biden vence e mantem relações com Bolsonaro
Para manter os inimigos próximo, Biden resolve manter relações com Bolsonaro para manter o Brasil na agenda anti-China. Mas sem ter que prestar lealdade canina ao novo mandatário americano, o presidente brasileiro aprende que há algo chamado barganha e, assim, exige concessões de Washington para não se aliar a Pequim. Este seria um dos melhores cenários para o Brasil.
Trump vence
Bolsonaro se enche de razão e o ministro Ernesto Araújo reforça a condição Brasileira de domínio/colônia dos EUA, levando governos estaduais a ignorarem ordens federais em política externa.
Como não imaginar João Doria, ou qualquer outro governador que sucedê-lo em 2022, mandando ao Aeroporto de Guarulhos e ao Porto de Santos tropas da polícia militar para liberar mercadorias vindas da China, inclusive a Coronavac e os insumos necessários a sua fabricação no Brasil. Seria um passo para a guerra civil.
Não seria um exagero imaginar esse cenário: a Anvisa já autorizou o Instituto Butantan, de São Paulo, a importar insumos necessários à produção da Coronavac, Doria é o principal rival de Bolsonaro no momento, o vice-presidente Hamilton Mourão já disse que o governo federal comprará a Coronavac paulista, mas Bolsonaro deixou claro que é sua a caneta que tem tinta.