27 de julho de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Apagão em São Paulo fez aumentar a reação de brasileiros contra privatizações

Modelo atual do setor elétrico levanta dúvidas sobre o processo de concessões de serviços essenciais à inciativa privada

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Segundo o jornal Correio Braziliense, o apagão que deixou milhares de pessoas sem energia em São Paulo colocou em xeque a privatização do setor elétrico. A chuva intensa, com rajadas de ventos de mais de 100km/h, alagou ruas, apagou semáforos, derrubou um sem-número de árvores e deixou 2,1 milhões de endereços sem energia por vários dias.

O Ministério Público (MP) instaurou um inquérito civil para investigar possíveis irregularidades na atuação da concessionária Enel.

A empresa, que atua nos estados do Rio de Janeiro, do Ceará e de São Paulo, deixou de operar em Goiás, em setembro, após enfrentar uma série de queixas por quedas de energia e o não cumprimento de metas. O governador Ronaldo Caiado (União Brasil), que à época chegou a entrar com um processo judicial para obrigar a Enel a realizar serviços de manutenção preventiva pouco antes do período chuvoso, voltou a criticar o modelo de concessão à iniciativa privada.

De acordo com o assessor político para o tema de Energia do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Cássio Cardoso, ainda falta investimento no setor. “Desde 2018, quando a Enel assumiu o controle da distribuição, houve uma redução de funcionários em 30%. Isso ocorreu anos após a privatização da distribuição de energia, que ocorreu em 1998”, lembrou.

Em momentos como o de agora, com muitas quedas de árvores, muitos cabos danificados, a empresa não tem gente suficiente para restabelecer o serviço prestado. Houve o corte de funcionários mesmo com o aumento da demanda, e quando chega um momento como esse, a empresa não dá conta de restabelecer todo o sistema a tempo, gerando um verdadeiro caos na cidade”, acrescentou Cardoso.

O especialista afirmou que os efeitos das mudanças climáticas, que já são devastadores, estão sendo agravados pela privatização do setor elétrico. Isso porque os eventos extremos tendem a aumentar, comprometendo ainda mais a estrutura do setor elétrico brasileiro. “Sem funcionários e sem investimentos no setor, os serviços de geração, transmissão e distribuição de energia ficarão ainda mais comprometidos”, alertou.

O engenheiro elétrico do Instituto Ilumina, Roberto D’Araújo, afirmou que o mesmo aconteceu no caso da privatização da Eletrobras. “A diminuição do quadro de funcionários aconteceu no Brasil inteiro, a própria Eletrobras reduziu o número de funcionários com a privatização. Se a Enel tem menos funcionários, ela não pode, por exemplo, fazer inspeção nas árvores antecipadamente em relação às mudanças climáticas. A prefeitura não pode fazer a poda de árvores sozinha, a distribuidora tem que estar presente. Se isso tivesse sido feito, talvez o choque em relação ao número de consumidores tivesse sido menor e não haveria tanto prejuízo”, avaliou.

Outro problema, de acordo com o engenheiro, seria a fiscalização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). “A Aneel, que é o órgão regulador, não tem uma equipe para fazer fiscalizações periódicas a essas concessões, identificando as localidades onde há riscos nas redes. O próprio histórico de aplicação de multas a essas concessionárias também mostra isso”, disse.