2 de maio de 2024Informação, independência e credibilidade
Política

Culpando “lapso mental”, vereador racista chora e pede desculpas após ameaça de cassação

Além de ofender baianos de vinícola, Sandro Fantinel também acusou ministros do STF de participar de orgias com crianças

Bastou ser ameaçado com a perda de mandato que o bolsonarista Sandro Fantinel (expulso do partido Patriotas), em vídeo nas redes sociais, pediu desculpas pelas declarações desta semana, em que criticou baianos por reclamarem do brutal trabalho, em vinícola do Rio Grande do Sul, com situação análoga à escravidão.

Nesta quinta (2), a Câmara de Vereadores de Caxias do Sul  abriu, por unanimidade, o processo contra o vereador Sandro Fantinel, que não esteve presente na sessão. A defesa, cheia dos clichês dos racistas arrependidos, foi feita de forma online.

Dizendo estar “extremamente arrependido”, Fantinel, alvo das Defensorias Públicas Estaduais do Rio Grande do Sul e da Bahia, disse que ele e a família estão sendo ameaçados.

“Registro que tenho muito apreço ao povo baiano e a todos do Norte/Nordeste do país. Em um momento de lapso mental, proferi palavras que não representam o que eu sinto pelo povo da Bahia e do Norte/Nordeste”.

Assim que terminou de ler sua cartinha de perdão, Fantinel tentou ser mais “sincero” e aos prantos falou do drama de sua família, a preocupação com os pais e que a esposa está pra deixar ele:

“Minha esposa chora noite e dia recebendo mensagens ofendendo ela com todos os pior nome que vocês pode imaginar (sic). Ela tá pensando até em me deixar. O meu pai e a minha mãe com 80 anos só choram dia e noite pelas ligações maldosas e ofensas que estão recendo. Eu pergunto: O que eles fizeram de errado? Cobrem de mim, não da minha família. Ameaças pro meu filho que tem medo de ir pra faculdade. Eles não fizeram nada”.

A ofensa aos baianos e perda do mandato não será a única preocupação do bolsonarista. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, ontem (2) que vai enviar um discurso do vereador com ataques a um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), para “apreciação” da Polícia Federal (PF).

A fala do vereador aconteceu em uma sessão ordinária na Câmara Municipal, em 17 de novembro do ano passado. “Um ministro do Supremo Tribunal Federal participou de uma orgia com crianças fora do Brasil. Como um cara desse vai permitir que sejam criadas leis mais severas para quem comete esse crime aqui dentro? A vergonha começa lá em cima”, afirmou na época.

A vinícola e o Racista

Depois que mais de 200 trabalhadores foram encontrados em situação análoga à escravidão no Centro da Indústria, Comércio e Serviços, de Bento Gonçalves, após a denúncia na PRF de três baianos que conseguiram fugir, o vereador bolsonarista reclamou do povo “do norte do país”.

“O patrão vai ter que pagar empregada para fazer limpeza para os bonitos todos os dias também? É isso que vai ter que acontecer? Temo (sic) que botar eles em hotel cinco estrela (sic) para não ter problema com o Ministério do Trabalho? Não contratem mais aquela gente lá de cima. Conversem comigo, vamos criar uma linha e vamos contratar os argentino”.

O bolsonarista foi além e se referindo baianos escravizados disse que eles não estão acostumados a trabalhar.

“Com os baiano (sic), que a única cultura que eles têm é viver na praia tocando tambor, era normal que isso fosse acontecer. Que isso sirva de lição, deixem de lado aquele povo que é acostumado com carnaval e festa para vocês não se incomodar (sic) novamente”.

Horas depois, preocupado com a repercussão negativa, o bolsonarista Fantinel disse, de forma esperada, que foi “mal interpretado” e que deu as declarações “no calor da discussão”.

Além de pedir à Câmara para retirar sua fala dos anais, ele reforçou que foi “um pouquinho infeliz no calor da fala”. Disse ainda o clichê de desculpas afirmou não ter nada contra os baianos: “tenho amigos e primos que moram no nordeste, na parte mais norte do país”. Fechou com chave de ouro afirmando que “adora as praias de lá”.

MPF

Sandro Fantinel defendeu que os acontecimentos envolvendo trabalhadores encontrados em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves (RS) são “exagerados” e “midiáticos”.

O Ministério Público do Trabalho deflagrou operação que encontrou trabalhadores alojados em uma pousada em Bento Gonçalves, cidade vizinha de Caxias do Sul. Os homens saíram da Bahia com promessa de emprego, alimentação e hospedagem, mas foram alimentados com comida estragada e submetidos a ataques com máquina de choque e spray de pimenta.

Eles foram explorados pela empresa Oliveira & Santana, que prestava serviços para as vinícolas Aurora, Salton e Cooperativa Garibaldi. Uma entidade empresarial da região relacionou as condições análogas à escravidão a políticas de assistência social e à falta de mão obra na Serra Gaúcha.

Após o resgate dos trabalhadores na quarta-feira passada, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania marcou, para 13 de março, uma reunião da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo.

A PRF resgatou 207 pessoas em situação análoga a escravidão em Caxias do Sul (RS). Foto: Divulgação/Governo da Bahia

Empresa

Em nota, no sábado (25), o CICBG explicou que vem acompanhando o caso. O Centro apontou que as autoridades precisam “cumprir o seu papel fiscalizador e punitivo para com os responsáveis por tais práticas inaceitáveis”, mas disse que “é preciso resguardar a idoneidade do setor vinícola”.

No fim da nota, porém, o centro criticou o assistencialismo e disse ser preciso trabalhar em projetos e iniciativas que ajudem a “suprir, de forma adequada, essa carência de mão de obra”. E teve a audácia de culpar programas assistenciais, como o Bolsa Família

Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade”