20 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Expresso

Maio com Jorge de Lima: um debate para além do social e do meio ambiente

Evento está marcado para a tarde deste sábado no Cine Arte Pajuçara

Por Tereza Pereira (Fotos cortesia de Afonso Xavier)

O poeta em debate no cine Arte Pajuçara

Neste sábado, 20, em continuação a homenagem aos 130 anos do nosso poeta Jorge de Lima (1893-1953), acontece no Centro Cultural Arte Pajuçara, em Maceió, o debate Jorge de Lima, “Literatura e Vida”, das 14h 30 às 17h, trazendo mais atividades culturais com representantes de instituições da literatura local, mobilizando especialistas, estudantes e público que cultua a obra do poeta alagoano.

Nosso Poeta, nos transporta a reflexão existencial, valorização da cultura afro-brasileira, elementos contemporâneos, crítica social, traços surrealistas e temática religiosa.

O evento deste sábado, terá como mediadora Ana Cláudia Aymoré – Doutora em Teoria Literária (UFRJ) e professora associada da UFAL, contando com palestras de Rosalvo Acioli – Poeta, ensaísta e historiador – “A formação intelectual e Literária de Jorge”; Maria de Lourdes do Nascimento – Escritora e ensaísta – “Jorge de Lima e a fome Universal” e Gilda Vilela Brandão – Doutora em Literatura e ensaísta – “Jorge de Lima: itinerário da Memória”.

A temática social, uma defesa permanente do poeta

Considerado múltiplo, Jorge de Lima, traz uma contribuição diversa desde sua fase lírica de características inicialmente parnasiana, que logo avança ao modernismo, até a exposição da realidade contextual em sua complexidade. Abordando temas como meio ambiente, cotidiano, temática social, místico-religioso, poema épico com subjetividade, elemento onírico e surrealismo. Poeta, romancista, pintor (colagem, fotomontagem), político, médico, biógrafo, professor, ensaísta e tradutor brasileiro. Foi escolhido para receber o Prêmio Nobel de Literatura de 1958, mas faleceu no Rio de Janeiro, em 1953.

Jorge Mateus de Lima, nasceu em 1893, na cidade alagoana de União dos Palmares, do seu sobrado da infância avistava a Serra da Barriga (ícone do maior quilombo “Dos Palmares”) e em seus depoimentos afirmara que aquela Serra com todo o seu ambiente, sem dúvida o teria influenciado no seu ser poético. Do conjunto de suas obras nosso poeta havia declarado a Homero Senna, em uma de suas entrevistas, depois publicado em livro, pela Civilização Brasileira, (República das Letras), Rio de Janeiro, que gostaria de ser lembrado por poemas como A ave, Boneca de Pano, Duas Meninas de tranças pretas e, ente outros Minha sombra. Nascido no agreste alagoano (União dos Palmares). Autor de diferentes romances como Calunga, O Anjo, A mulher obscura e Guerra dentro do Beco, reescreveu Salomão e as mulheres. Seu trabalho poético tem uma enorme contribuição literária universal.

Respeitado por escritores, professores, críticos literários contemporâneos como Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde). Em Maceió, 15, teve o lançamento, no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGAL) em parceria com a Academia Alagoana de Letras (AAL), da obra “Jorge de Lima e Alceu Amoroso Lima – Correspondências”, de autoria do professor e escritor Leandro Garcia Rodrigues (UFMG). O livro foi também editado na ocasião pela editora da Universidade Estadual de Alagoas (Eduneal).

A escritora e ensaísta Maria de Lourdes do Nascimento, que está neste sábado, 20, no Centro Cultural Arte Pajuçara, conversou com o site É Assim, trazendo de início uma fala de Francisco César Leal “Jorge de Lima é um poeta de faculdades criadoras ilimitadas, sua poesia tem um desdobramento da realidade”. Ela concorda com o professor, jornalista, poeta, crítico literário cearense, e complementa dizendo que o nosso Poeta transita pelo universal com a humildade dos grandes escritores como Camões e Fernando Pessoa, para citar os portugueses. Nosso grande poeta estava sempre além de sua aldeia, com suas diversas qualidades, trazia o mítico, transcendental e temas universais. Só o famoso Invenção de Orfeu, o coloca entre os grandes poetas universais, lamentavelmente não teve sua obra traduzida em tantos outros idiomas.

Para Maria de Lourdes do Nascimento, “A Túnica Inconsútil”, por exemplo, é de uma enorme profundidade, a genialidade de Jorge de Lima junto com seu escritor, quase irmão, de longa parceria Murilo Mendes, aprofunda o caminho entre as lutas do Homem e a unidade divina, é neste período que busca a restauração em Cristo. A escritora e ensaísta lembra que Jorge de Lima sempre fez questão de dizer que nunca fez poesia para agradar alguém, a poesia para ele era uma forma de libertação e jamais para “agradar qualquer espécie de chatos”. Sua poesia é multifásica de uma profunda realidade com a arte, inserida no contexto social, a sua sensibilidade e libertação incomodava a muitos.

Maria de Lourdes do Nascimento, autora de Jorge de Lima: Um universo poético, traz também outro comentário, desta vez do alagoano Moacir Medeiros de Santana, que afirma em uma citação sobre Jorge de Lima, “há quem o acuse de não compreender a missão social do escritor nos dias de hoje”…Medeiros lembra que Jorge comentava, “as forças da opressão pretendem sufocar a liberdade dos direitos humanos”, e segue :“meus livros Calunga, A Túnica Inconsútil, finalmente toda minha obra literária é social, por que nela eu falo do Homem, de sua presença no mundo, de suas lutas e sofrimentos, de suas inquietações e de seus desejos”. E mais: “O romance é que emerge social, revolucionário, católico, etc. Como se revelasse ao escritor sua alma grafada em letra de forma” (Jorge de Lima).

Poeta de várias temáticas, tem respeitosa relação como o meio ambiente, o ser humano, suas ligações emotivas e o pertencimento de sua casa, da sua comunidade. Encontramos em sua obra como Invenção de Orfeu, em seu Canto III – Poemas relativos, observamos os dramas, as aflições humanas. Os poemas de Jorge de Lima são muito atuais, contextualizados, dentro de sua complexa linguagem poética, a exemplo de Canto IV – “As aparições”, são trazidas as profundas agonias decorrentes das aflições humanas, temores, injustiças, tudo está presente em sua obra.

“… Vós não viveis sozinhos,

Os outros vos invadem”…

(Canto III – Poemas relativos – Jorge de Lima)

Obra sensível e genial, diz o o poeta José Geraldo Marques

O escritor alagoano, José Geraldo Marques – Doutor em Ecologia e Pós-doutor em Ecologia Humana, membro da Academia Alagoana de Letras, também considera sensível e genial a obra de Jorge de Lima, que abrange temas como ambientalismo, questão social, as desigualdades sociais, sensibilidade humana, conhecimentos diversos e comunidade.

Em entrevista com o site É Assim, nosso respeitado professor José Geraldo, trouxe-nos uma importante contribuição sobre personagens poéticas de Jorge de Lima, com elementos, sujeitos como aves (pássaros), narrados em vários de seus poemas. Um de seus artigos, auxiliou na compreensão dos mitos, crenças, presentes na obra de nosso Poeta. A colaboração, veio a exemplo de seu artigo: “Pássaro” é bom para se Pensar: Simbolismo Ascensional em Etnoecologia do Imaginário (José Geraldo Marques, 2010), uma busca da integração entre a etnozoologia e a etnopsiquiatria. Há uma instituição complexa entre as crenças e o contato com a natureza (biofobia e biofilia).

 

“Ninguém sabia donde viera a estranha ave ”…

“Quando a seca anual assolou os rebanhos, alguém disse: ”

…”A ave comeu os cordeiros”.

“… a ave desabou sobre o mundo como um Sansão sem vida. ”

“Então um simples pescador apanhou …”

“… achei o corpo de uma grande ave mansa “…

“E alguém recordou que a ave levava ovos aos anacoretas. ”

“Um mendigo falou que a ave o abrigava muitas vezes do frio”.

“…dá-me as penas para eu escrever a minha vida tão igual

à da ave em que me vejo…mais do que me vejo em ti, meu pai. ”

Jorge de Lima, um precursor na defesa da natureza e do meio ambiente

(A ave – poema de Jorge de Lima).

 

O escritor Pedro Pereira Rocha Neto (Pedro Rocha), natural de Paulo Jacinto, afirma que a obra de Jorge de Lima, um dos grandes expoentes da literatura alagoana, incentiva e nos proporciona um lugar especial, nos estimula sempre novas criações, novos saberes.  Além de grande poeta, nascido em União dos Palmares, foi também médico, romancista, pintor, ensaísta, tradutor. Uma criação poética diversa.

Entre os poemas que marcaram sua memória, lembra Pedro Rocha “O Acendedor de Lampiões” e destaca o seu livro Poemas Negros, em que Jorge de Lima valoriza a importância da cultura africana, a composição étnica do povo brasileiro e a exploração do trabalho escravo, a forma desumana em que os afrodescendentes eram subjugados.

 

“Para não apanhar mais, falou que sabia fazer bolos: ”

…”Depois falou só, só diante da ventania”

“Que ainda vem do Sudão; ”

“falou que queria fugir”

“dos senhores e das judiarias deste mundo para o sumidouro”.

 

(Maria Diamba – Poema de Jorge de Lima)