20 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Povo Yanomami sofre com malária, pneumonia, desnutrição e contaminação por mercúrio

Reportagem do Fantástico mostrou de perto o genocídio na Terra Indígena

Reprodução: TV Globo

Em reportagem especial neste domingo, o Fantástico da TV Globo acompanhou de perto o cenário de tragédia humanitária em Terra Yanomami, com os repórteres Sônia Bridi e Paulo Zero testemunhando a distribuição de remédios e alimentos, além do resgate de mulheres e crianças doentes.

A equipe da Globo entrou na Terra Yanomami com o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena, Junior Hekurari, e o novo secretário da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), Weibe Tapeba. A visita deles é para organizar o programa de socorro.

A situação mais grave está na parte Norte, onde estão dos pelotões especiais de fronteira do Exército – e a maior concentração de garimpo no Território Yanomami.

A partir de 2017, o garimpo avançou por dezenas de quilômetros na região do Homoxi. Os garimpeiros tomaram a pista da Sesai, expulsaram a equipe de saúde e usaram o posto como depósito de combustível. Em 2022, policiais federais estiveram lá e destruíram máquinas do garimpo. Em represália, os garimpeiros botaram fogo no posto de saúde.

Malária

Em 2022, foram registrados 22 mil casos de malária. Isso em uma população de 30 mil Yanomamis. No entanto, no Homoxi, onde o posto foi tomado e queimado pelo garimpo, houve apenas 7 casos notificados. Os números oficiais, portanto, não refletem toda a realidade.

Nos anos 1990, uma grande operação do Governo Federal retirou os garimpeiros que haviam invadido a região. Em 1992, a Terra Yanomami foi demarcada. Depois disso, o garimpo quase desapareceu. Mas voltou em 2016.

Os números mostram que o aumento dos casos de malária acompanha o do garimpo. Em dezembro de 2022, a área atingida pelo garimpo chegava a 5 mil hectares. Um aumento de mais de 300% em relação ao final de 2018.

A crise sanitária matou 570 crianças Yanomami de 2019 a 2022, 29% a mais que nos quatro anos anteriores. Os dados do Ministério da Saúde foram compilados pela agência Sumaúma.

Bolsonaro

No sábado (28), o ex-presidente Jair Bolsonaro divulgou um relatório da CPI que, em 2008, investigou a morte de crianças indígenas por subnutrição.

Motivada pela crise entre os guarani-kaiowá, no Mato Grosso do Sul, a CPI cita avanço da malária entre os Yanomami, em Roraima. No post de Bolsonaro, a foto usada é de uma criança de outra etnia, do Maranhão.

O ex-presidente diz “que nunca um governo dispensou tanta atenção e meios aos indígenas como o dele. ”No entanto, os dados mostram que, no período Bolsonaro, as mortes de crianças Yanomami por desnutrição quase quadruplicaram.

Com dados do Ministério da Saúde, o Fantástico separou só as mortes por desnutrição de crianças de zero a 5 anos. Foram 152 nos últimos quatro anos, contra 33 no período anterior. Um aumento de 360%.

“Temos também lavagem de dinheiro, temos a atuação de organizações criminosas e, nesta questão específica da saúde, não há dúvida que nós temos indícios do crime de genocídio”. Flávio Dino, ministro da Justiça.

A situação chegou a este ponto, mas não foi por falta de aviso. Ao todo, foram 21 ofícios com pedidos de socorro em 4 anos. Sem resposta. Para piorar, em 2020 uma liminar da Justiça Federal obrigava o governo a combater o garimpo.

Além disso, nos últimos anos, o Governo Federal não cumpriu uma decisão do Supremo Tribunal Federal que ordenava a retirada de todos os garimpeiros daqui da Terra Indígena Yanomami. A decisão, também de 2020, em plena pandemia, alertava para o risco de uma crise como esta.

Garimpo

Em 2022, três operações conjuntas de combate ao garimpo foram planejadas. Duas foram canceladas porque o Ministério da Defesa não disponibilizou helicópteros de grande porte, necessários para operar na terra indígena.

O Fantástico acompanhou a terceira, quando agentes do Ibama e da Polícia Federal destruíram ou apreenderam uma centena de aeronaves e inutilizaram boa parte da infraestrutura do garimpo.

O ex-presidente Bolsonaro esteve em Roraima e visitou um garimpo ilegal. Ainda deputado, ele propôs acabar com a Terra Indígena Yanomami porque é “riquíssima em madeiras nobres e metais raros”.

No sábado, dia 21, o ex-presidente disse, em uma rede social, que a fome Yanomami é uma farsa da esquerda – e que o governo dele executou 20 operações de saúde em terras indígenas.

Na quinta-feira (26), o STF, em nota, disse que identificou indícios de que o governo Bolsonaro teria fornecido informações falsas à Justiça sobre assistência e proteção à comunidade Yanomami.

Vale constar que ex-presidente da Funai, Marcelo Xavier, nem o ex-Ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira comentaram sobre as acusações de genocídio.

Polícia Federal, Ibama, Funai e Ministério da Defesa estão planejando operações para expulsar de vez o garimpo, mas a tarefa é imensa e pode levar anos para a recuperação das roças e para os rios voltarem a ter vida.