19 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Alagoas

Prefeituras ainda amam investir no São João ignorando consequências da quadra chuvosa

Fortes chuvas seguirão fazendo estragos em Alagoas enquanto não houver investimento sério em prevenção

Ruas ou bairros inteiros de cidades alagoanas ficaram debaixo d’água após um final de semana intenso de fortes chuvas. O governo de Alagoas estima que haja 23 mil desabrigados e que pelo menos uma pessoa tenha morrido em Joaquim Gomes.

As causas, no entanto, não são inéditas. As chuvas deste período do ano, “acima do esperado”, fazem parte da quadra chuvosa, que se estende da primeira quinzena de abril à primeira quinzena de agosto. A característica é chover mais neste período do que no restante do ano.

No início de abril, a Defesa Civil Estadual apresentou o Plano de Acionamento Interinstitucional da Quadra Chuvosa para este ano de 2023, pois a prevenção rende melhores resultados do que a realização de resgates e investimentos em auxílios após uma tragédia.

Vale constar que, apesar de ser um evento anual, é possível ser pego de surpresa pela quantidade de chuvas. Com as mudanças climáticas em todo o planeta, eventos e catástrofes naturais ficam cada vez mais fortes. Mas não há como se surpreender com uma quantidade “acima do normal” se sempre existe a probabilidade de as chuvas serem acima do normal.

Foi o que aconteceu neste ano, não para a surpresa de quem já viu este filme inúmeras vezes. Pior para os milhares de desabrigados em cidades com ruas alagadas.

Ainda mais para aqueles fortemente afetados pelas chuvas, como os moradores de municípios como Atalaia ou Marechal Deodoro, que passaram por desabamentos ou alagamentos graves.

São João

Infelizmente, também não é surpresa que isso deva se repetir em 2024 e nos anos seguintes. No mesmo período da quadra chuvosa, há os festejos de São João. A festa típica mais celebrada do Nordeste, que em Alagoas resulta em uma explosão no turismo e nas vendas no comércio, não tem redução de investimentos.

Prefeito JHC durante encerramento do polo Carlos Moura, no estacionamento do Jaraguá. Foto: Itawi Albuquerque/ Secom Maceió

Em Maceió, somente com o cachê de artistas, foram gastos mais de R$ 8 milhões. Na liderança, estão Gusttavo Lima com R$ 980 mil, Wesley Safadão com R$ 700 mil e Leonardo com R$ 550 mil, além de Luan Santana com R$ 500 mil. O prefeito, JHC, afirmou que o período de festas movimentou mais de R$ 200 milhões de reais, uma quantia difícil de mensurar, especialmente após as cenas de restaurantes debaixo d’água.

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Internautas compartilham inundações em Maceió neste final de semana de chuva

A capital alagoana não foi o principal alvo das chuvas deste ano, mas as consequências poderiam ter sido contornadas. Neste domingo, a Autarquia Municipal de Desenvolvimento Sustentável e Limpeza Urbana (Alurb) anunciou a retirada de 122 toneladas de lixo, provenientes do descarte irregular por toda a cidade, na foz do Riacho Salgadinho, na Praia da Avenida, o que contribuiu para a inundação na região.

E boa parte dos gestores municipais faz isso: corre atrás do prejuízo, posando para fotos e parecendo surpresos com a repetição dos anos anteriores. Mas basta sacrificar um pouco do orçamento do São João para mudar esse cenário. Não é fácil, não é barato, mas seria um investimento de curto prazo para evitar novas situações de inundação.

A prefeita Ceci Cunha foi criticada pelas poses em fotos das ruas alagadas de Atalaia

Em vez de recolher o lixo jogado, deveria haver um maior investimento em campanhas de conscientização sobre o descarte adequado. Ter ruas asfaltadas é excelente, mas sem transversais em paralelepípedo, as casas não conseguem escoar a água que acaba indo para as calçadas. Isso também vale para os sistemas de drenagem, como a Casal, BRK e outros, que finalmente deveriam se entender para liberar as galerias. Além disso, seria importante ter mais áreas verdes nas margens dos rios.

Claro, isso é chover no molhado. Não vai acontecer. Em 2024, teremos eleições municipais. Os gestores precisam do palco para falar com seus eleitores. Investir na prevenção de tragédias não é tão interessante quanto fazer um São João grandioso. E, diante da eventualidade da próxima quadra chuvosa, se as prefeituras continuarem repetindo suas ações, para o próximo ano, vamos postar esse texto novamente. Pois uma nova ocorrência vai acontecer.