22 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Blog da Graça Carvalho

Qual o futuro da imprensa brasileira nos próximos quatro anos?

Será que a Lei de Acesso à Informação vai ter alguma serventia nos próximos quatro anos?

A notícia publicada ontem no site de notícias Valor Econômico de que um  cinegrafista da TV Globo foi forçado por um agente da Polícia Federal a apagar imagens que gravou do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), no feriado da última sexta-feira, é algo assustador em um país cuja a Constituição Federal respalda, expressamente, o direito de informar e de ser informado.

Segundo a notícia,  o profissional da imprensa acompanhava a visita de Bolsonaro ao Centro de Adestramento da Ilha da Marambaia (Cadim), área da União administrada pela Marinha, no Rio de Janeiro, e embarcou junto com o presidente eleito e aliados no cais do Clube Náutico de Itacuruçá.

O cinegrafista estava a trabalho, com seu equipamento, gravando imagens do presidente eleito, na Restinga de Marambaia,  quando teria sido abordado pela PF e forçado a apagar as imagens. Depois, obrigado a voltar imediatamente para o local onde embarcou. Ainda conforme a notícia, o policial federal coletou dados e tirou foto do cinegrafista.

Também é relatado que, no Iate Clube, onde Bolsonaro embarcou, a imprensa foi expulsa pelo diretor social da instituição, que se identificou apenas como Valdir. O diretor disse ser militar e ameaçou prender repórteres que esperavam Bolsonaro no pier do clube.
A reportagem procurou a Policia Federal, mas não conseguiu falar com ninguém por conta do feriado.  A reportagem também  procurou a Marinha para obter mais informações sobre quem pode ter acesso à Restinga de Marambaia e quantas pessoas estavam na comitiva de Bolsonaro, mas não obteve essa resposta.
Na nota divulgada pela Marinha, a instituição afirma apenas que o Centro de Adestramento da Ilha da Marambaia (CADIM), localizado na Costa Verde do Rio de Janeiro, recebeu a visita de Bolsonaro.

“O político visitou a Organização Militar da Marinha que, tradicionalmente, oferece privacidade e segurança para autoridades nacionais e estrangeiras”, afirmou.
“Cabe destacar que o local é o único em todo o Estado do Rio de Janeiro onde navios, aeronaves e veículos militares podem fazer uso de armamento real para adestramento. Em função da proximidade com várias outras OM, o deslocamento das unidades a serem adestradas é feito de forma rápida, economizando tempo e recursos”, diz a nota da Marinha

Imprensa barrada
Ainda segundo a reportagem do Valor Econômico, também na sexta-feira, Carlos Bolsonaro, filho do presidente eleito e vereador no Rio de Janeiro, postou em uma rede social vídeo com trecho da entrevista concedida ontem pelo pai. Nas imagens, Bolsonaro aparece dizendo que não impediu parte da imprensa de participar da entrevista.
Conforme a referida reportagem, o  texto publicado no Instagram, Carlos diz que “tem gente que tem o único intuito de denegrir e virarão pó pelo próprio descrédito que criam. Veja a simples resposta que foi ignorada para propositalmente induzir que o presidente eleito teria vetado parte da imprensa e seria contra a liberdade nos meios de comunicação”.

O Valor Econômico informa ainda que, ao contrário do afirmado pelo presidente eleito no trecho e o vereador no texto, parte da imprensa foi, sim, barrada na entrevista, de ontem. Veículos como os jornais Valor Econômico, O Globo, O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo, Rádio CBN e agência Bloomberg foram vetados.  Bolsonaro permitiu que 21 profissionais – quase todos de televisão – entrassem. O grupo correspondeu a menos da metade dos jornalistas e fotógrafos que aguardavam do lado de fora da residência.
E mais, uma agente da Polícia Federal teria sido responsável por chamar os jornalistas que estavam liberados para entrar — e portava uma prancheta com poucos nomes de emissoras de televisão anotados em uma folha de papel. Quando contestada sobre os critérios de escolha, a agente disse apenas que não poderia liberar o restante da imprensa.

Enfim, a pergunta que não quer calar: qual o futuro da imprensa brasileira nos próximos quatro anos? Ao que parece a dificuldade não será apenas lidar com o “nada a declarar”, mas com afronta direta à liberdade de imprensa e à integridade dos profissionais que ousarem exercer “desafiar” o presidente eleito com uma caneta, um microfone ou uma câmera na mão.

Em tempo, é de se questionar também: será que a Lei de Acesso à Informação , que surgiu para dar efetividade ao exercício do direito à informação de todos os cidadãos, vai ter alguma serventia nos próximos quatro anos?