7 de outubro de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Queiroz: “Dividi salários para ampliar gabinete de Flávio Bolsonaro”

Ex-assessor, por escrito ao MPE-RJ, afirmou que recolheu parte dos salários de funcionários do filho do presidente para distribuir a outras pessoas

O ex-policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) finalmente respondeu ao Ministério Público do Rio de Janeiro sobre as suspeitas de corrupção, apontadas pelo Coaf.

E ele afirmou, por escrito, que recolheu parte dos salários de funcionários do filho do presidente para distribuir a outras pessoas para que trabalhassem pelo então deputado estadual, ainda que não formalmente empregadas. O objetivo era aumentar o número de assessores e aproximar Flávio de sua base eleitoral.

Entretanto, na petição entregue ao MP-RJ, ele diz que o senador não tinha conhecimento da prática:

“Por contar com elevado grau de autonomia no exercício de sua função, resultante de longeva confiança que nele depositava o deputado, o peticionante nunca reputou necessário expor a arquitetura interna do mecanismo que criou ao próprio deputado e ao chefe de gabinete”. Flávio Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, por escrito.

Queiroz é alvo de uma investigação criminal desde que o Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) identificou uma movimentação atípica em sua conta bancária de R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. O ex-assessor afirmou em janeiro que daria as explicações apenas ao MP “por respeito” ao órgão:

“Após a exposição de minha família e minha, como se eu fosse o pior bandido do mundo, fiquei muito mal de saúde e comecei a evacuar sangue. Fui até ao psiquiatra, pois vomitava muito e não conseguia dormir“, Fabrício Queiroz, que também é policial militar da reserva.

Alegando fortes dores, o ex-assessor atribuiu os problemas detectados recentemente em sua saúde à exposição do caso Coaf na imprensa. As dores, segundo ele, o teriam feito faltar a depoimentos marcados pelo Ministério Público.

Queiroz foi submetido a uma cirurgia para retirada de um tumor maligno no intestino, no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde estava internado desde 30 de dezembro, e teve alta nesta terça-feira. Ele disse que pagou a conta dos serviços médicos com recursos próprios e declarou ter recibo para comprovar, mas não quis dizer o valor.

Corrupção e milícias

Apesar de todas as denúncias na Rede Globo, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) segue ignorando a emissora para dar respostas. Se antes já concedeu entrevistas na Record e Rede TV, no final de janeiro foi a vez da SBT, onde ele afirmou que não vai renunciar ao mandato “para proteger o governo federal”.

Além de ficar com o salário de funcionários na Assembleia Legislativa do Rio, quando vereador, e todo o imbróglio de seu assessor Queiroz no Coaf, foi descoberto que o filho do presidente está envolvido com milícias do Rio. Além de dar trabalho para policiais do sindicato do crime, ele homenageou os criminosos que podem estar envolvidos na morte da também vereadora Marielle Franco, ano passado.

Entre oficiais generais da ativa, das três Forças,  existe um consenso de que Flávio não foi convincente até aqui nas explicações que mistura operações financeiras envolvendo imóveis no Rio com a movimentação atípica de valores seus e de seu ex-assessor.

Nesta semana, alguns setores da cúpula das Forças Armadas fizeram chegar ao núcleo militar do Planalto a sugestão de que Flávio não assumisse a cadeira no Senado, em fevereiro. Isso poderia, para eles, evitar a contaminação do debate legislativo pelo caso. Mas ele nega:

É uma mentira, nem sei de onde surgiu essa história. Vou tomar posse e trabalhar muito. Não vou me afastar, e quero aproveitar a oportunidade para falar da grande perseguição que estou sofrendo”. Flávio Bolsonaro, senador eleito (PSL-RJ).

Seu pai, o presidente, passou a mão em sua cabeça. Nesta semana, na TV Record, depois de fugir da entrevista coletiva nesta semana, isso foi o que ele resolveu dizer:

“Nós não estamos acima da lei, como qualquer outro estamos embaixo da lei. Agora que cumpra a lei, não faça de maneira diferente para conosco. Não é justo atingir o garoto para tentar me atingir. Para o meu filho aquele abraço, fé em Deus, que tudo será esclarecido com toda certeza”. Jair Bolsonaro, presidente.

E Flávio tende a seguir utilizando a imagem de garoto inocente ao lado do pai. Esta é sua postagem mais recente no twitter pessoal:

Flávio e Queiroz: corrupção

Para esconder este e futuros problemas, o Banco Central já estuda excluir parentes de políticos da lista de monitoramento obrigatório das instituições financeiras e acabar com a exigência de que todas as transações bancárias acima de R$ 10 mil sejam notificadas ao Coaf.

Ou seja: casos como os de Flávio nunca viriam à tona.

Ataques à Globo

O filho do presidente Jair Bolsonaro aproveitou para acusar o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) de vazar informações contra ele para a TV Globo. Antes, em nenhum momento, ele chegou a criticar todos os vazamentos de investigações em outros partidos.

Flávio Bolsonaro reiterou que a investigação do Ministério Público “tem muitas coisas estranhas, ilegalidades flagrantes, claras”. Segundo Bolsonaro, seu sigilo foi quebrado, argumento que já foi contestado pelo MP-RJ, depois que o senador eleito pediu suspensão da investigação no STF, por conta de seu foro especial.

Milícias

Até novembro do ano passado, senador eleito Flávio Bolsonaro empregou em seu gabinete, na Alerj, a mãe e a mulher do capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, que é suspeito de comandar milícia no Rio de Janeiro.

Homem-forte do Escritório do Crime, Adriano faz parte da organização suspeita do assassinato de Marielle Franco. O policial foi alvo de um mandado de prisão nesta terça-feira e está foragido.

Raimunda Veras Magalhães e Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega ocupavam o cargo CCDAL-5 e ganhavam R$ 6.490,35 e deixaram o gabinete no mesmo dia, em 14 de novembro. Citada no relatório do Coaf que investiga o ex-assessor Fabrício Queiroz, Raimunda repassou R$ 4.600 para a conta do ex-policial militar.

Marielle Franco e Marcelo Freixo

O miliciano Adriano, por duas vezes, foi homenageado por Flávio Bolsonaro na Alerj. Em 2003, propôs uma moção de louvor ao policial militar por desenvolver sua função com “dedicação, brilhantismo e galhardia”. À época, o miliciano já estava preso por homicídio.

Não só isso, como após homenagear os dois principais suspeitos de comandarem a milícia que estaria envolvida no assassinato de Marielle Franco, Flávio foi o único a votar contra a proposta de Marcelo Freixo (PSol) de conceder a medalha Tiradentes em homenagem à vereadora.

Mas, suas palavras na SBT, claro, foram outras:

“Eu sou contra as milícias. Sempre fiz a defesa dos servidores da segurança pública, mas sou contra qualquer tipo de estado paralelo”

Veja a entrevista completa: