4 de maio de 2024Informação, independência e credibilidade
Política

Vaza Jato revela valor das palestras e Moro pede ‘escusas’ por ‘não ser totalmente sincero’

Mistro distorceu a reportagem, antes de precisar se desculpar, ao justificar a omissão de uma palestra remunerada na prestação de contas

Moro e Deltan tiveram conversas vazadas divulgadas pelo The Intercept

Hoje ministro da Justiça, o então juiz da Lava Jato Sérgio Moro era muito bem pago por suas palestras enquanto ainda atuava, deixando de informar a atividade remunerada ao TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), de Porto Alegre. Tudo isso em mais uma revelação da nova fase da Vaza Jato, em mais uma parceria da Folha com o The Intercept Brasil.

No trecho que nem ele teve como se esquivar, dizendo por exemplo que não se lembrava ou que poderia ter sido um texto alterado, Moro elogiou em conversa com o procurador Deltan Dallagnol, sempre ele, o coordenador da Lava Jato, a remuneração em um dos eventos:

“Grupo Sinos, lá de Novo Hamburgo, pediu seu contato. Ano passado dei uma palestra lá para eles, bem organizada e bem paga”. Sergio Moro, no Telegram com Deltan, 22 de maio de 2017.

Moro relatou ao TRF4 que participou de 16 eventos externos em 2016, que incluem 9 palestras, 3 homenagens e 2 audiências no Congresso Nacional. No entanto, a palestra no Sinos não aparece na declaração do atual ministro e ex-juiz.

Desde junho de 2016, uma resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) determina que os magistrados registrem suas atividades externas mas os desobriga de informar o valor de cachês em eventos remunerados.

Estimam-se que Moro ganhou nessa palestra da Sinos entre R$ 10 mil e R$ 15 mil. Claro, algumas outras também podem ter acontecido, só não tendo sido ainda reveladas nas conversas. Para servir de comparação, o salário líquido de Moro naquele setembro de 2016 (época da palestra) foi de R$ 28,4 mil.

Deltan Dallagnol, parceiro de acusação e de palestras com Moro, teria faturado R$ 400 mil em cachês só no ano passado. Nesse ano de 2018, o coordenador da Lava Jato recebeu R$ 428 mil de salário líquido como procurador.

Outro lado:

Claro, antes de pedir desculpas, Moro usou a técnica de apelar pra fake news e desviar do assunto, atacando a reportagem da Folha e ainda soltando a nota. Sem mencionar o pedido de ‘escusas’, feito logo depois da nota a seguir, o ministro distorceu a reportagem ao justificar a omissão de uma palestra remunerada na prestação de contas de suas atividades como juiz federal em 2016.

E liberou essa nota:

“O Ministro da Justiça e Segurança Pública não reconhece o teor de mensagens obtidas por meios criminosos, que podem ter sido editadas ou adulteradas.

A palestra citada pela reportagem foi ministrada em 21 de setembro de 2016, enquanto o sistema de cadastramento eletrônico de atividade de docência eventual no âmbito do TRF4 foi criado posteriormente, pela Resolução 10, de 9 de fevereiro de 2017, do TRF4.

Para o período anterior, se não houve registro, foi por puro lapso. Apesar disso, não havia qualquer conflito de interesse e a palestra sobre enfrentamento da corrupção e a responsabilidade do setor privado foi na época bastante divulgada na imprensa, como pode ser verificado neste link: http://coletiva.net/comunicaca o/a-convite-do-grupo-sinos-sergio-moro-palestra-sobre-corrupcao,126408.jhtml. Nada havendo a esconder.

Como condição para a realização da palestra, o Grupo Sinos realizou, em 16 de junho de 2016, e a pedido do então juiz, uma doação de R$ 10 mil para o Pequeno Cotolengo do Paraná, entidade beneficente dedicada ao acolhimento de pessoas com múltiplas deficiências. Não foi divulgado à época que o então juiz era o responsável pela doação, pois buscava-se evitar autopromoção com caridade. A família do então juiz tem um histórico de dedicação à causa das pessoas com deficiência. O valor recebido diretamente pelo então juiz é questão privada e foi inferior ao montante doado.

As palestras ministradas pelo então juiz eram via de regra gratuitas. Quando cobradas, os valores não eram elevados e envolviam necessariamente doações a entidades beneficentes efetuadas pela empresa contratante. A concessão de palestras ou aulas, mesmo remuneradas, é atividade considerada legítima para magistrados.” Sergio Moro, ministro da Justiça.