Pela primeira vez na história do Brasil, um presidente foi eleito com mais de 60 milhões de votos. Luís Inácio Lula da Silva (PT) recebeu, precisamente, 60.345.999. É um apoio massivo, mas não tão diferente do que recebeu o derrotado Jair Bolsonaro (PL), presidente que teve 58.206.354.
Com uma diferença de apenas 0,9%, fica evidente portanto que o Brasil rachou. Mais ainda do que quando Dilma Roussef (PT) superou Aécio Neves (PSDB), quando a petista recebeu 51,64% dos votos válidos para a petista, superando o rival em 3,4 milhões de votos. Desta vez são menos de 2,1 milhões de votos de diferença.
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E esse eleitorado, que deve antagonizar os próximos quatro anos de Lula, vale lembrar, colocou nas assembleias estaduais e federais nomes de peso do bolsonarismo, que prometem impor mais dificuldade ainda.
O ponto mais delicado será cumprir uma das principais promessas de campanha e acabar com o orçamento secreto, manobra do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que solidificou o centrão ao lado de Bolsonaro e se mostrou muito eficiente eleitoralmente. Lira, aliás, já disse que deve-se respeitar a maioria conservadora do Congresso.
Lula nem esconde e vive repetindo que o Brasil de 2023 será mais difícil de governar do que o Brasil de 2003.
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Oposição eleita
Dos 513 deputados eleitos, só o PL, legenda de Bolsonaro, conseguiu emplacar a maior bancada da Casa, com 99 parlamentares —23 a mais que a bancada atual. Com isso, o partido terá quase um em cada cinco votos na Câmara, o que o torna peça chave no jogo político.
Para alívio do próximo governo, o PT também cresceu e passou de 56 para 68 nomes. A federação composta pela sigla petista com o PV e o PCdoB soma, no total, 81 deputados. A outra federação que também apoia Lula, formada pelo PSOL e pela Rede Sustentabilidade subiu de 10 para 14 deputados.
A eleição para o Senado também foi marcada pela vitória de aliados de Bolsonaro: os partidos de direita emplacaram 19 das 27 vagas em jogo, incluindo a eleição de ex-ministros, como: Tereza Cristina (PP-MS), Damares Alves (Republicanos-DF), Marcos Pontes (PL-SP) e Rogério Marinho (PL-RN).
Também foram eleitos para o Senado o atual vice-presidente da República, Hamilton Mourão (Republicanos-RS), e o ex-secretário de Bolsonaro, Jorge Seif (PL-SC).
Outros aliados de Bolsonaro conquistaram cadeiras na Casa, como Magno Malta (PL-ES), Wilder Morais (PL-GO) e Hiran Gonçalves (PP-RR), além de Wellington Fagundes (PL-MT), Romário (PL-RJ) e Cleitinho (PSC-MG). Sergio Moro (União Brasil-PR), que fazia oposição ao governo, se elegeu com bandeiras do presidente, de quem se reaproximou no segundo turno.
Centrão
Na avaliação do sócio diretor da Contatos Assessoria Política e analista político do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), André Santos, a governabilidade de Lula não está ameaçada, mas o petista está mais em desvantagem em relação ao tamanho das bancadas.
Segundo Santos, a base da esquerda contaria com aproximadamente 120 deputados, podendo chegar a 140, se incluir os parlamentares do PDT.Com os partidos de centro, entre eles o PSDB, Cidadania, MDB e PSD, por exemplo, o número pode chegar a 340.
Esses partidos não compõem a base bolsonarista, mas tinham posição alinhada com a do governo Bolsonaro em algumas propostas. Os principais partidos aliados de Bolsonaro atualmente são o PP, sigla de Lira, o PL e o Republicanos. Esses somam 187 deputados.
Discurso de união
Ciente deste cenário, já em tom de estadista, Lula repetiu mais de uma vez a promessa de que, na primeira semana após ser eleito, reunirá todos os 27 governadores —seus apoiadores ou não— para ouvir demandas, reclamações e estreitar laços.
Com isso, Lula pretende marcar uma diferença em relação o Bolsonaro, que não lidou bem com a oposição. Com a vitória petista, o desafio que se impõe é saber se estes vão querer se reunir com ele, assim como uma parcela expressiva da sociedade que foi até o fim com Bolsonaro. Os antagônicos vencidos, agora, precisam ser governados.