20 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Política

CMN: 28 milhões de brasileiros perdem sem cubanos no Mais Médicos

Meio milhão de alagoanos ficarão sem médicos; Mais de 8 mil dos 18 mil profissionais são cubanos; Cidades do Norte e Nordeste serão as mais afetadas

O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Glademir Aroldi, divulgou nota ressaltando a preocupação dos prefeitos das cidades com menos de 20 mil habitantes com a saída dos 8,5 mil profissionais cubanos que atuam no programa Mais Médicos. A entidade alerta que é preciso substituí-los sob o risco de mais de 28 milhões de pessoas ficarem desassistidas.

A CNM apelou para a ampliação do programa para municípios e regiões que “ainda apresentam a ausência e a dificuldade de fixação do profissional médico”. Segundo a entidade, um estudo apontou que o gasto com o setor de saúde sofreu uma defasagem de 42% na última década, o que sobrecarregou os cofres municipais.

Ainda de acordo com a confederação, os municípios, que deveriam investir 15% dos recursos no setor, ultrapassam, em alguns casos, a marca de 32% do seu orçamento, não tendo condições de assumir novas despesas.

Alagoas

Com o programa, mais de 700 municípios brasileiros tiveram um médico pela primeira vez na história. E cerca de 528 mil alagoanos podem ficar sem atendimento médico, na Atenção Básica de Saúde, com a saída dos médicos cubanos.

Em todo estado, 70 municípios possuem médicos no Programa Mais Médicos. São 232 vagas para esses profissionais e, atualmente, são preenchidas por 132 cubanos e 86 brasileiros.

Izabelle Monteiro Alcântara Pereira, presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Alagoas (COSEMS/AL), acredita que perder os médicos cubanos pode ser drástico e trazer graves consequências para os municípios brasileiros. Aproximadamente um sexto da população alagoana deixará de ser assistida por esses profissionais.

Vagas não preenchidas

Criado em 2013, na presidência de Dilma Rousseff, o programa envia médicos brasileiros e estrangeiros a regiões mais pobres e com baixa cobertura de assistência médica, e leva atendimento a mais de 60 milhões de pessoas, segundo o governo.

Atualmente, 8,3 mil dos 18,3 mil médicos do programa são cubanos, 45% do total. Eles estão presentes em todos os estados e no Distrito Federal, e ocupam vagas que não puderam ser preenchidas por brasileiros.

O ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, um de seus idealizadores, afirma que “nunca conseguimos que, só com médicos brasileiros, fosse possível completar as vagas. Bolsonaro coloca em risco a saúde de milhões de brasileiros, que dependem do programa.”

Em cinco anos de programa, nenhum edital de contratação de médicos brasileiros conseguiu contratar quantidade suficiente de profissionais para as vagas abertas. O maior edital resultou na contratação de 3 mil brasileiros.

O Conselho Federal de Medicina (CFM) argumenta que há médicos suficientes no Brasil, mas faltam políticas e incentivos para que eles atuem nas regiões mais distantes.

Médicos cubanos participavam do programa quando brasileiros não se interessavam pelas regiões a serem atendidas, principalmente em comunidades quilombolas, indígenas ou mesmo periferia de grandes cidades. As áreas mais beneficiadas são, portanto, estados do Norte e Nordeste, além do interior de todo o país.

Dados do CFM apontam que, no fim de 2015, havia 400 mil profissionais no país. No começo de 2018, eram 452,8 mil, bastante concentrados nos grandes centros e nas capitais brasileiras.

Uma ironia triste é que a cidade de Ponta Grossa, no Paraná, pode perder até 75% dos médicos nos próximos, pois cerca de 60 dos 80 profissionais da cidade são cubanos. A cidade que no 2º turno deu 73% de votos ao Bolsonaro perderá 75% dos médicos em seu governo.

Bolsonaro

O presidente eleito Jair Bolsonaro questionou a formação dos especialistas cubanos, condicionou sua permanência no programa à revalidação do diploma e impôs como único caminho a contratação individual, argumentou o governo cubano.

O governo de Cuba comunicou então, nesta quarta-feira (14), que vai se retirar do programa Mais Médicos devido a declarações “ameaçadoras e depreciativas” do presidente eleito Jair Bolsonaro, que anunciou modificações “inaceitáveis” no projeto.

Quando deputado federal pelo PP-RJ, o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) protocolou uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da medida provisória (MP) editada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) que criou o programa Mais Médicos. Bolsonaro chegou a pedir que fosse concedida uma liminar para suspender a medida provisória.

O programa Mais Médicos tem 18.240 profissionais – sendo 11 mil cubanos, segundo o governo do país caribenho – em 4.058 municípios, cobrindo 73% das cidades brasileiras. Na ação, protocolada em julho de 2013, o parlamentar fez uma série de críticas à MP. Ele já contestava a não exigente da revalidação do diploma para que um estrangeiro exerça a profissão no Brasil.

Íntegra – Nota da CMN

O valor do Programa Mais Médicos (PMM), ecoado nos diversos cantos do Brasil, demonstrou ser uma das principais conquistas do movimento municipalista frente à dificuldade de realizar a atenção básica, com a interiorização e a fixação de profissionais médicos em regiões onde há escassez ou ausência desses profissionais. Importante destacar que a estruturação e a organização da Atenção Básica de Saúde é pauta permanente da Confederação Nacional de Municípios (CNM) junto ao Executivo Federal e ao Congresso Nacional.

De acordo com a Organização Panamericana da Saúde (OPAS), atualmente são 8.500 médicos cubanos atuando na Estratégia Saúde da Família e na Saúde Indígena. Esses profissionais estão distribuídos em 2.885 Municípios, sendo a maioria nas áreas mais vulneráveis, como o norte do país, o semiárido nordestino, as cidades com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), as terras indígenas e as periferias de grandes centros urbanos.

Entre os 1.575 Municípios que possuem somente médico cubano do Programa, 80% possuem menos de 20 mil habitantes. Dessa forma, a saída desses médicos sem a garantia de outros profissionais pode gerar a desassistência básica de saúde a mais de 28 milhões de pessoas.

Nos últimos meses, a CNM, juntamente com as representações das entidades municipalistas estaduais, organizou inúmeras reuniões com o governo federal sobre a necessidade de manutenção e aprimoramento do Programa Mais Médicos, com adoção gradual de novas estratégias para interiorização e fixação dos profissionais médicos e outras categorias necessárias para o atendimento básico às populações. Em audiências recentes com o ministro da Saúde, a Confederação discutiu inclusive a ampliação do Programa para Municípios e regiões que ainda apresentam a ausência e a dificuldade de fixação do profissional médico.

O anúncio referente à decisão do Ministério da Saúde de Cuba de rescindir a parceria, na última quarta-feira, 14, aflige prefeitos e prefeitas desta Confederação. Imediatamente, a entidade buscou em Brasília o atual governo e o governo de transição para que, em conjunto, fosse possível adotar medidas que garantam a manutenção dos serviços de atenção básica de saúde. Cabe destacar que, na última década, estudo apontou que o gasto com o setor de Saúde sofreu uma defasagem de 42%, o que sobrecarregou os cofres municipais. Os Municípios, que deveriam investir 15% dos recursos no setor, já ultrapassam, em alguns casos, a marca de 32% do seu orçamento, não tendo condições de assumir novas despesas.

A presente situação é de extrema preocupação, podendo levar a estado de calamidade pública, e exige superação em curto prazo. Nesse sentido, a CNM aposta no diálogo entre as partes para os médicos cubanos permanecerem no país pelo menos até o final deste ano ou, se possível, por tempo maior a ser acordado entre os dois países. Durante esse período, acreditamos que o governo federal e de transição encontrarão as condições adequadas para a manutenção do Programa. Enquanto aguardamos a rápida resolução do ocorrido pelo órgão competente, estamos certos de que os gestores municipais manterão o máximo empenho para seguir o atendimento à saúde de suas comunidades.

Os Municípios brasileiros, na missão de prestar serviços públicos à população, representados pela Confederação Nacional de Municípios, não medirão esforços para a resolução deste impasse.

Glademir Aroldi
Presidente da Confederação Nacional de Municípios