Nesta sexta-feira, 23, Considerado chegou em casa e encontrou dona Nildinha fantasiada de índia, com todos os adereços, uma lata de cerveja na mão, o som ligado à toda altura e cantando sem qualquer ritmo ou afinação: – Mulher casada que anda sozinha, é andurinha, é andurinha…
Neto zeloso, ficou a olhar a cena e a imaginar o que estava acontecendo com sua avó. É bem verdade que os tempos são de folia e o brasileiro faz tudo na vida para ter um carnaval. É quando as pessoas se entregam e fazem exatamente nesta época o que gostariam de fazer o ano inteiro, mas a sensatez fala mais alto nesse momento. Afinal, a vida é muito mais do que a festa de momo.
Mas, quem gosta de carnaval conta nos dedos horas e minutos para chegar a festa e deixar rolar. Dona Nildinha é uma dessas pessoas que brincou o carnaval à vida inteira com amigas, amantes, família, enfim, com todos que lhe proporcionassem uma boa farra.
Agora em casa, sozinha, fazendo o fazendo o passo, deixou o neto boquiaberto. Não sabia se sorria com a velha desajeitada ou se chorava. Sobretudo por que lhe veio a mente o pensamento dividoso sobre o estado de saúe dela.
-O que está acontecendo minha vó?
-Estou lhe esperando pra gente ir para os Filhos da Pauta!
-O bloco já passou. Foi na semana passada.
Furiosa, ela baixou ovolume do som, parou a coreografia e reclamou do neto que ficou de lavá-la ao bloco do pessoal da imprensa nas prévias de Jaraguá. “O Filhos da Pauta” desfilou na sexta-feira, 17, à noite. Foi um sucesso. Dona Nildinha certamente teria se esbaldado ao som do frevo “Ói nós aqui de novo, no meio do povo/ fazendo o carnaval, somos gente batuta, somos filhos da…”
Mais do que revoltada ela partiu para cima dele e bradou:
– Você é um filho da puta mesmo, nunca cumpre o que diz.
-Tenha calma vó.
-Calma, uma porra. Você daria pra ser politico, que mente e rouba o ano inteiro.
-Eu viajei e não pude vir aqui…
-Não tem desculpas. Ora viajar…Viajei um cacete!
O clima obviamente ficou tenso. Considerado com as barbas de molho recolheu-se a um canto da casa e passou a ouvir o sermão. O pior é que tinha ido ao encontro dela, exatamente para pedir-lhe o generoso “auxílio carnaval” para a próprio deleite em Olinda. Depois dessa se encolheu e fez menção de sair casa.
-Fique aí, seu orelha seca…
-Mas a senhora está muito nervosa…
-Você sabe que eu gosto de carnaval. Se não podia vir mandava aquele bexiguento do seu amigo Batoré me levar, ou aquele outro Fofa Chão, pé de cana.
-Deixa a turma quieta vó. Eles não gostam de carnaval…
-Mentira que aquele que vocês chamam de Beleboi está indo para o carnaval do Recife…
-E daí, o que tem isso demais?
-Nada. Mas, se aquele galego irmão dele, que tem o dedo do novembro azul, for também eu vou atrás.
-Olhe a pior coisa do mundo é uma velha assanhada.
-Velha é a tua mãe que vive comendo purê e tentando namorar o “Oio de Jeep”, mas não consegue.
-Por que ela não puxou a você que só gosta de político safado e soldado embriagado…
-Mas estou aqui enxuta e pronta pra me divertir. E se não tem Filhos da Pauta vou tomar uma no bar do Suruagy.
-Quer saber, ou a senhora está biruta ou é mesmo uma filha da puta!