20 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Política

Governo Bolsonaro incinerou milhões de reais em medicamentos contra câncer e Aids

No meio do desperdício também estão medicamentos para pacientes com atrofia muscular espinhal, a terapia mais cara do mundo

Segundo dados do Ministério Saúde desde 2019, durante a gestão Bolsonaro, a pasta, que deixou vencer 39 milhões de vacinas contra a Covid-19, também desperdiçou insumos para pacientes que buscam tratamento contra doenças graves, com câncer e Aids.

Não tem como interpretar de outra maneira: o governo Jair Bolsonaro (PL) incinerou medicamentos usados no tratamento de doenças raras e de alto custo, avaliados ao todo em pelo menos R$ 13,5 milhões.

Nos dados, obtidos via Lei de Acesso à Informação, consta-se até mesmo o desaparecimento de duas doses do Spinraza, cada uma comprada por R$ 160 mil pelo governo federal, para tratar pacientes como AME (atrofia muscular espinhal). Esta terapia é uma das mais caras do mundo.

Entre os itens perdidos estão vacinas contra sarampo e rubéola, pentavalente, hepatites e tríplice viral, além de medicamentos contra câncer, hepatite C e outras doenças. Até mesmo testes e medicamentos destinados a pessoas que vivem com HIV, avaliados em R$ 8,5 milhões, foram desperdiçados.

Também foram descartadas949 unidades do Translarna, produto usado para pacientes com distrofia muscular de Duchenne, que causa degeneração muscular progressiva, ao custo de R$ 2,74 milhões

Isso porque em 2021 o Ministério da Saúde lançou a nova mascote do SUS, identificada como Rarinha, pois uma das bandeiras do governo Bolsonaro era o “cuidado com as doenças raras”. Na cerimônia estava então primeira-dama Michelle Bolsonaro, que se mandou para os EUA nesta semana.

Vale constar que os dados apresentados pelo Ministério da Saúde não permitem afirmar que a totalidade dos produtos foi descartada por causa do fim da validade. Em alguns casos, medicamentos podem ter sido reprovados em testes de controle de qualidade ou inutilizados por causa do armazenamento incorreto.

Integrantes do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmam, porém, que a maior parte dos insumos foi incinerada após o fim da validade. Além disso, dizem que outros produtos podem estar vencidos no estoque e ainda serão encaminhados para o descarte.

Outro lado

O ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga, que comandou a pasta de março de 2021 a dezembro de 2022, afirmou que não tem dados sobre estoques.

Luiz Henrique Mandetta, primeiro ministro da Saúde do governo Bolsonaro, de janeiro de 2019 até o início da pandemia em abril de 2020, disse que no período em que comandou a pasta houve esforço para adequar a gestão dos estoques, ao transferir os produtos de armazéns no Rio de Janeiro para uma central em Guarulhos, na Grande São Paulo.

Disse ainda que muitas compras são feitas por estimativa de demanda, como em campanhas de vacinação, e que o uso depende da adesão da população.

Já o atual deputado federal Eduardo Pazuello, que também foi ministro da Saúde no governo Bolsonaro (cumprindo sua “missão” na pandemia de junho de 2020 a março de 2021), não se manifestou.

Pera de medicamentos de alto custo:

Translarna

  • Tratamento: distrofia muscular de Duchenne
  • Unidades incineradas: 949
  • Valor: R$ 2,74 milhões

Betagalsidase

  • Tratamento: doença de Fabry
  • Unidades incineradas: 259
  • Valor: R$ 2,46 milhões

Eculizumabe

  • Tratamento: hemoglobinúria paroxística noturna
  • Unidades incineradas: 127
  • Valor: R$ 1,73 milhão

Vimizim

  • Tratamento: mucopolissacaridose IVA
  • Unidades incineradas: 632
  • Valor: R$ 1,61 milhão

Galsulfase

Tratamento: mucopolissacaridose VI

Unidades incineradas: 283

Valor: R$ 1,24 milhão

Alfagalsidase

  • Tratamento: doença de Fabry
  • Unidades incineradas: 272
  • Valor: R$ 1 milhão

Metreleptina

  • Tratamento: síndrome de Berardinelli-Seip
  • Unidades incineradas: 47
  • Valor: R$ 1,1 milhão

Idursulfase

  • Tratamento: síndrome de Huner
  • Unidades incineradas: 186
  • Valor: R$ 985 mil

Nusinersen (Spinraza)

  • Tratamento: atrofia muscular espinhal (AME)
  • Unidades incineradas: 2
  • Valor: R$ 319 mil

Nitisinona

  • Tratamento: tirosinemia hereditária do tipo 1
  • Unidades incineradas: 1.200
  • Valor: R$ 229 mil

Alentuzumabe

  • Tratamento: esclerose múltipla
  • Unidades incineradas: 2
  • Valor: R$ 56 mil

Kanuma

  • Tratamento: deficiência de lipase ácida
  • Unidades incineradas: 1
  • Valor: R$ 23 mil

Total: R$ 13,5 milhões