25 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Governo Bolsonaro tem dossiê e age contra quase 600 “antifascistas”

Grupo de servidores de servidores federais e estaduais de segurança, além de professores, são críticos do governo

André Mendonça. ministro da Justiça, em live com o presidente Jair Bolsonaro

Um grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança, além de três professores universitários, um deles ex-secretário nacional de direitos humanos e atual relator da ONU sobre direitos humanos na Síria, viraram alvo do Ministério da Justiça.

A ação foi colocada em prática no mês passado. O grupo tem algo em comum: todos são críticos do governo de Jair Bolsonaro. E considerados integrantes do “movimento antifascismo”.

Segundo o UOL, o ministério produziu um dossiê com nomes e, em alguns casos, fotografias e endereços de redes sociais das pessoas monitoradas. A atividade contra os antifascistas é realizada por uma unidade do ministério, a Seopi (Secretaria de Operações Integradas). Uma das cinco secretarias subordinadas ao ministro André Mendonça.

A secretaria é dirigida por um delegado da Polícia Civil do Distrito Federal e tem uma Diretoria de Inteligência chefiada por um servidor com formação militar. Ambos foram nomeados em maio por Mendonça.

Protegida por um decreto do presidente Jair Bolsonaro, nº 9.662 de 1º de janeiro de 2019, a Seopi não submete todos os seus relatórios a um acompanhamento judicial. Assim, vem agindo nos mesmos moldes dos outros órgãos que realizam normalmente há anos o trabalho de inteligência no governo, como o CIE (Centro de Inteligência do Exército) e o GSI (Gabinete de Segurança Institucional).

Além da PF e do CIE, o documento produzido pelo Ministério da Justiça foi endereçado a vários órgãos públicos, como Polícia Rodoviária Federal, a Casa Civil da Presidência da República, a Abin (Agência Brasileira de Inteligência), a Força Nacional e três “centros de inteligência” vinculados à Seopi no Sul, Norte e Nordeste do país.

Assim, o dossiê do Ministério da Justiça se espalhou pelas administrações públicas federal e estaduais e não se sabe a consequência dessa disseminação. Pode ser usado, por exemplo, como subsídio para perseguições políticas dentro dos órgãos públicos.

O presidente Jair Bolsonaro considera que os movimentos antifascistas, que protestam contra seu governo, são marginais e terroristas. A lista dos “terroristas”, no entanto, tem um sigilo. Para contornar a LAI (Lei de Acesso à Informação), a Seopi carimbou os documentos sobre os antifascistas como “de acesso restrito”.

O artigo 55 do decreto diz que informações relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem terão “acesso restrito a agentes públicos legalmente autorizados e à pessoa a que se referirem, independentemente de classificação de sigilo, pelo máximo de cem anos”. Ou seja, segundo o critério adotado pela Seopi as informações que produziu só poderiam ser conhecidas daqui a um século.

Procurada, o Ministério da Justiça teve isso a dizer:

“O Sistema Brasileiro de Inteligência (instituído pela Lei nº 9.883/1999) é responsável pelo processo de obtenção, análise e disseminação da informação necessária ao processo decisório do Poder Executivo. A atividade de Inteligência de Segurança Pública é realizada por meio do exercício permanente e sistemático de ações especializadas para identificar, avaliar e acompanhar ameaças potenciais ou reais. O objetivo é subsidiar decisões que visem ações de prevenção, neutralização e repressão de atos criminosos de qualquer natureza que atentem contra a ordem pública, a incolumidade das pessoas e o patrimônio. Como agência central do Subsistema de Inteligência de Segurança Pública (Decreto 3695/2000), cabe à Diretoria de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do Ministério da Justiça e Segurança Pública, como atividade de rotina, obter e analisar dados para a produção de conhecimento de inteligência em segurança pública e compartilhar informações com os demais órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência”. Nota do Ministério da Justiça.