3 de maio de 2024Informação, independência e credibilidade
Maceió

“Oi, meu nome é Gabriela e eu tenho espinhas”

O desabafo de quem sofre com os comentários maldosos e “sem noção” dos “perfeitos” de plantão

A postagem de hoje foi inspirada no desabafo da pedagoga pernambucana Gabriela Marroquim, de 24 anos, residente há 13 anos em Maceió. Ela usou seu perfil no Instagram para expressar indignação em relação aos comentários sobre suas espinhas, após ter inicado uma transição para o veganismo  e cortado os anticoncepcionais que tomava para controlar o problema.

“Conclui que não queria mais utilizar no rosto produtos ou medicamentos que agridem meu organismo ou a animais”, explica Gabriela, que diz estar em um período de transição, experimentando outros tratamentos. Contudo, ela se sente cobrada a ter um rosto perfeito.

Diz já ter escutado frases como: “o que aconteceu com o seu rosto?”; “você não era assim”; “você tem um rosto tão bonito, mas tá cheio de espinhas”. Enfim, essas e outras. Até de um dermatologista, pasmem, ela escutou a pérola: “seu namorado não se incomoda com seu rosto assim?”.

Não deu outra. Resolveu  falar sobre suas espinhas, mas não necessariamente sobre sua insatisfação com elas,  mas com os comentários que pessoas próximas e até completos desconhecidos estão fazendo sobre elas.

Palavra de especialista

Pois é,  espinhas na cara, pernas finas, culotes, barriga de barril, quem é que não tem qualquer uma dessas ou de outroas características para chamar de sua?

A insatisfação faz parte do ser humano, isso é fato, mas a coisa complica mesmo quando, além de não conviver bem com a “imperfeição”, a pessoa ainda tem que aguentar comentários maldosos ou mesmo sem noção de quem coloca o dedo na ferida.

“Vixe, como você está magra! Quanta espinha, nem usa ralo, né? Tá comendo direitinho, se cair vai rolar”. Enfim, quem já não ouviu algo parecido ou pior?

A psicóloga  Ana Paula  dos Anjos afirma que os  próprios pais, muitas vezes, reforçam a ditadura da perfeição

Aproveitando o desabafo de Gabriela, o Blog ouviu a psicóloga e psicoterapeuta Ana Paula dos Anjos sobre essa ditadura da perfeição. “Quando as pessoas entram no seu processo de autoaceitação, a fala das pessoas não é absorvida, porque ela consegue separar o que é do outro e o que é dela”, explica Ana Paula.

Segundo ela, muits vezes, as falas dos próprios pais, grandes referenciais dos filhos, reforçam a ditadura da perfeição. “A gente vive em uma sociedade que impõe diversos tipos de padrões de beleza, status, e as pessoas vêm buscando corresponder para se sentirem incluídas. Você está magra, o que você fez, tá doente? Você está gorda, o que houve? É uma cobrança constante. As pessoas estão adoecendo, por ser impossível se adequar a determinado padrão”, alerta a psicóloga.

As consequências, segundo Ana Paula, são crises de ansiedade, depressão e uma série de outros transtornos psicológicos gravíssimos, a exemplo da bulemia e da anorexia. A especialista alerta: quando o sentimento da vitima desses tipos de comentários está trazendo mal estar, sensação de incapacidade e dificudade de separar o que é do outro e o que é de si, é importante procurar ajuda profissional.

Enfim, segue o relato de Gabriela, que autorizou a divulgação e quer continuar trocando ideias com as pessoas sobre esse assunto. Mais que um ato de coragem, uma lição de cidadania. Confira e, se desejar, dê a sua opinião.

 

“Oi, meu nome é Gabriela e eu tenho espinhas. Quem me conhece sabe que eu tenho muito cuidado com minhas palavras e atitudes de forma a não machucar ninguém. Nos últimos meses, as pessoas estão me machucando com suas próprias palavras e atitudes com frequência. Resolvi falar sobre minhas espinhas aqui pois é algo que vem me incomodando bastante. Não as espinhas, os comentários que pessoas próximas e até completos desconhecidos estão fazendo sobre elas. .

Sim, acredite. Escutei vários tipos de coisas (algumas absurdas) de pessoas do trabalho, médicos de emergência que estavam me consultando por motivos completamente diferentes, e recentemente por um dermatologista. São frases como: “o que aconteceu com seu rosto? você não era assim”, “você já foi no dermatologista?”, “Toma Roacutan”‘, “quantas espinhas no seu rosto”, “você tem um rosto tão bonito, mas está cheio de espinhas”. Essa semana cheguei ao ponto de receber o seguinte comentário de um dermatologista: “seu namorado não se incomoda com seu rosto assim? Nem fala nada das suas espinhas?”.

O fato é que AS PESSOAS SE INCOMODAM MAIS COM MINHAS ESPINHAS DO QUE EU MESMA. E sabe o que é pior? Além de se incomodarem, acabam não refletindo sobre o como suas palavras pesam. Eu fingia que não era nada no início, mas hoje percebo o quanto me machucam. O quanto sou cobrada a ter um rosto perfeito, mas deixa eu contar uma coisa, eu não sou perfeita e nem quero ser.

Meu rosto era “limpo” de espinhas porque tomava anticoncepcional, antes disso, usava ácidos e controlava as espinhas que apareciam. Hoje, sou vegetariana e pesquiso bastante sobre o veganismo. Concluí que não queria mais utilizar no rosto produtos  ou medicamentos que agridem meu organismo ou animais nesse processo. Iniciei minha transição para os cosmeticos naturais e veganos. E está sendo uma descoberta maravilhosa. Quantas possibilidades existem de produtos que se adequam a cada necessidade (eu ainda estou a procura dos que são ideais para mim, experimentando várias dessas possibilidades).

A escolha dessa transição foi tomada com total clareza e estava pronta para aceitar não só meu rosto, mas meu corpo como ele realmente é. Vejam que não foi algo simples. E aí, durante esse processo, escuto comentários que me machucam demais. Se eu que estou feliz com essa transição e me aceitando assim já me incomodo com os comentários feitos, imagina quem está com baixa autoestima e infeliz consigo e com seu corpo.

POR FAVOR, PRESTEM ATENÇÃO NAS PALAVRAS USADAS COM O OUTRO E SOBRE O OUTRO.

Obrigada quem leu até aqui. Foi um desabafo e uma forma de mostrar outro ponto de vista. Caso alguém esteja passando por algo parecido ou queira indicação de marcas aqui em Maceió voltadas para esse fim, estou super aberta para trocar idéias.” ?? (@gabimarroquim)