23 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Pastores que pediram propina foram ao FNDE só para orar, diz presidente do Fundo

O escrachado caso de corrupção no MEC envolvia um gabinete paralelo e propinas em ouro

Milton Ribeiro e Pastor Gilmar: “Ourando” no MEC

Os pastores evangélicos que viviam no Ministério da Educação pedindo propinas a prefeitos contemplados com  recursos da educação foram ao FNDE, quando pediram propina em ouro “só para orar”.

Pelo menos foi o que disse em depoimento, na quinta-feira (7/4), na Comissão de Educação do Senado, o presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Lopes da Ponte.

Ele se isentou de envolvimento em corrupção na liberação de recursos para municípios. Mas confirmou que participou de quatro agendas com os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, apontados como integrantes de um gabinete paralelo, no Ministério da Educação para a arrecadação de propina, sobre o qual o ex-ministro Milton Ribeiro tinha conhecimento.

Ligado ao ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira — foi assessor do cacique do Centrão —, Ponte admitiu que conheceu Gilmar e Arilton durante agendas do MEC. Indagado sobre a função dos dois pastores nas reuniões das quais participou, o presidente do FNDE disse que eram apenas fazer “alguma fala” ou “oração”.

Ponte afirmou que não encontrou com prefeitos a pedido de Gilmar e Arilton. Garantiu, ainda, que foram suspensos preventivamente os repasses do FNDE aos municípios citados nas denúncias sobre a cobrança de propina, pela dupla, para a liberação dos recursos.

Na última terça-feira, a Comissão de Educação ouviu cinco prefeitos que teriam sido procurados pelos pastores, e três confirmaram que receberam pedido de propina. Mesmo assim, Ponte atestou a honestidade do ex-ministro da Educação.

“Tem a minha mais elevada estima. Acredito na conduta dele e na postura que ele teve frente ao Ministério da Educação. Acredito que terceiros usaram o nome dele, e o meu, eventualmente, para se gabaritar ou fazer lobby sem a nossa autorização”, afirmou.

Desmentido

Ponte, porém, caiu em contradição quando indagado sobre a licitação para a compra de ônibus escolares — com sobrepreço de R$ 732 milhões. Ele disse aos senadores que o pregão seguiu todas as recomendações da Controladoria-Geral da União (CGU). Tentou negar, também, que o governo recuou e reduziu as cotações dos veículos apenas na véspera do leilão.

“Seguimos todas as recomendações da CGU e seguimos acatando as determinações de controle, em especial o TCU (Tribunal de Contas da União) e a CGU, assegurando, desta forma, a lisura de todos os nossos processos”, observou.

Porém, o FNDE atropelou as orientações dos órgãos de controle e da própria área técnica, que apontaram risco de sobrepreço nos valores dos ônibus. Documentos mostram que valor inicial sugerido para as aquisições era de R$ 1,3 bilhão. A equipe do diretor de Ações Educacionais do Fundo, Garigham Amarante — indicado pelo presidente do PL, Valdemar Costa Neto —, apresentou uma estimativa de preços de R$ 2,082 bilhões para o pregão.

Após alertas da CGU, a metodologia de cálculo foi refeita, mas o cenário pouco se alterou. O valor máximo da licitação passou para R$ 2,045 bilhões e foi liberado em 18 de março.

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) questionou o presidente do FNDE sobre as alterações nos valores do leilão. Ponte alegou que o ajuste para reduzir os valores do pregão havia sido feito antes de o caso vir a público. “A republicação já foi com R$ 1,5 bi também. Salvo engano, 24 ou 25 de março, oito dias antes do pregão, que ocorreu na terça-feira”, assegurou.

O processo administrativo do próprio Fundo, no entanto, aponta que a alteração ocorreu apenas na véspera da licitação dos ônibus, em 4 de abril. “O preço foi reduzido dos R$ 2 bilhões que o senador Alessandro falou para R$ 1,5 bilhão. Sabe quando? Na véspera do pregão”, cobrou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apontando a contradição na explicação de Ponte.

Por causa da mudança de última hora, o preço total para a aquisição dos veículos caiu R$ 510 milhões. Mesmo assim, o TCU decidiu embargar o resultado do pregão. (Com Agência Estado)