23 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Justiça

Procurador italiano que inspirou Lava Jato critica parcialidade de Moro

Gherardo Colombo afirma que dois juízes diferentes garantiriam uma maior imparcialidade e que procuradores italianos nunca coordenaram atuações com outras partes

Gherardo Colombo foi procurador na Mãos Limpas, operação italiana que inspirou Sergio Moro

Na década de 1990, aconteceu na Itália a operação Mãos Limpa, que inspirou Sergio Moro em sua atuação como juiz na Lava Jato. Ele chegou a escrever em 2004 um artigo sobre o caso italiano, elogiando seus resultados no combate à corrupção e relativizando as críticas ao trabalho dos magistrados que atuaram na investigação.

Gherardo Colombo, 73 anos, foi um dos procuradores da Mãos Limpas, afirmou que a mesma recebeu ataques e também fora acusado de quebrar o sigilo das investigações. Da mesma forma teve que responder a um processo disciplinar por ter levantado numa entrevista suspeitas sobre chantagens na política da Itália. E nunca foi condenado.

Assim como na Lava Jato, a Mãos Limpas também foi acusada de abusar de prisões temporárias, das delações premiadas e de manipular a mídia e por supostamente perseguir políticos.

O que diferencia as duas é que a operação italiana nunca foi acusada de coordenar atuações de procuradores e juízes. Suspeita que hoje paira sobre a operação brasileira.

Afastado do Judiciário desde 2007, Colombo disse que acompanha de longe e quando pode as notícias sobre os diálogos entre Moro e outros membros da força-tarefa da Lava Jato que vêm sendo divulgados pelo site “The Intercept Brasil” há mais de um mês.

Ele evita opinar sobre possíveis irregularidades na condução da operação brasileira, mas é enfático sobre a comunicação entre um juiz e um procurador durante uma investigação:

“Na minha opinião, um juiz só pode se comunicar com um procurador formalmente, por meio de documentos oficiais. A exceção são as trivialidades”. Gherardo Colombo, procurador da Mãos Limpas, operação italiana que inspirou Sergio Moro.

Vaza Jato

Segundo mensagens divulgadas, Moro teve conversas privadas mantidas com membros do Ministério Público Federal que atuam na Lava Jato, sugeriu testemunhas a investigadores, os orientou sobre o uso de provas e opinou sobre um acordo de delação premiada.

A Constituição do Brasil determina que não haja vínculos entre o juiz e as partes em um processo judicial. Pela isenção, o juiz e a parte acusadora, aqui o MPF, não devem trocar informações nem atuar fora de audiências. Moro e MPF não reconhecem a autenticidade das mensagens atribuídas a eles.

Colombo acredita que dependendo do conteúdo de conversas privadas mantidas entre juízes e procuradores numa determinada operação, é possível que elas influenciem o resultado de um julgamento. Para ele, o juiz precisa se manter distante das partes envolvidas para manter sua imparcialidade e realmente fazer justiça.

“Dois juízes diferentes garantem a uma maior imparcialidade. Se as regras sobre a imparcialidade e do processo não são seguidas, a Justiça não pode ser justa. Na Itália, uma operação como a Lava Jato e a Mãos Limpas têm dois juízes justamente para garantir um julgamento imparcial. Um juiz acompanha a investigação, autorizando mandados de busca e apreensão ou mesmo prisões temporárias. Um segundo se mantém distante do caso durante a apuração. Só atua no julgamento dos acusados”. Gherardo Colombo

No Brasil, um mesmo juiz pode cumprir as duas funções. Na Lava Jato, por exemplo, Moro autorizou ações de investigação e também julgou acusados.