1 de maio de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Bolsonaro exige que jornais publiquem dado distorcido ou não dará mais entrevistas

“Se vocês não fizerem nenhuma matéria sobre isso amanhã nos jornais, eu não dou mais entrevista para vocês, tá legal? Tá combinado? Toda a imprensa, tá combinado?”

Como condição para conceder entrevistas, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) queria pautar a impressa “no dia seguinte”. E não só isso, mas com informações distorcidas de dois anos atrás..

Em outubro de 2017, o The Intercept Brasil publicou reportagem sobre uma auditoria nas despesas do Senac-RJ com publicidade e palestras em 2016. Nas despesas, constavam 15 palestras feitas pelo jornalista Merval Pereira, da GloboNews e do jornal O Globo, no valor total de R$ 375 mil. Ou seja, R$ 25 mil por palestra.

Crítico do atual governo, Merval foi alvo de Bolsonaro. Distorcendo as informações, o presidente afirmou que Merval recebeu R$ 375 mil por uma única palestra. Depois, ameaçou não dar mais entrevistas à “toda a imprensa” se a informação incorreta não fosse publicada.

“Acabei de postar aí uma matéria sobre o Merval Pereira. Palestra por R$ 375 mil, tá legal? Tá ok? 375 ‘pau’ por uma palestra no Senac, tá ok? Façam matéria agora. Se vocês não fizerem nenhuma matéria sobre isso amanhã nos jornais, eu não dou mais entrevista para vocês, tá legal? Tá combinado? Toda a imprensa, tá combinado? E tem mais nome também, eu só botei um ‘nomezinho’ hoje. Não estou perseguindo ninguém. Agora, gastar dinheiro público para palestras, aí é brincadeira. Fica escrevendo o tempo todo lá críticas. Tem que criticar, mas mostrar que é uma pessoa isenta, né? Imprensa isenta. Se não fizerem matéria escrita amanhã nos jornais, não tem mais entrevista para vocês aqui, tá legal?”. Jair Bolsonaro, presidente.

O Senac-RJ administra recursos públicos e é bancado pela arrecadação de um percentual fixo sobre a folha de pagamento das empresas do setor do comércio. A Receita Federal recolhe os valores e os repassa à entidade.

À época, assessoria da Fecomércio-RJ, da qual o Senac-RJ faz parte, defendeu a contratação de Merval afirmando que as palestras estavam “dentro dos objetivos do Senac” de discutir as “circunstâncias vivenciais” de seus usuários.

Merval responde

Intitulada “A fake news de Bolsonaro”, Merval disse em coluna recente que não recebeu os R$ 375 mil, pois deu 13 palestras para o Senac. O colunista também criticou a fala de Bolsonaro sobre parar de dar entrevistas se uma notícia sobre as palestras não fosse publicada.

“As palestras eram abertas a representantes do comércio, da indústria, da educação, políticos locais, estudantes. Cada palestra teve a respectiva nota fiscal, incluindo os impostos devidos, e foi declarada no meu Imposto de Renda. Deixar de dar entrevistas se jornalistas não fizerem o que ele deseja? Essa ‘ameaça’ seria apenas risível, não dissesse ela muito de uma personalidade que a cada dia se mostra mais autoritária. E desgostosa de poder muito, mas não poder tudo”. Merval Pereira, jornalista.