2 de maio de 2024Informação, independência e credibilidade
Justiça

Governo Bolsonaro ignora TCU e fecha contratação suspeita de R$ 450 milhões

Secretaria de Comunicação sabia de apuração, mas mesmo assim assinou contrato

A Secretaria Especial de Comunicação do governo de Jair Bolsonaro (PL) passou por cima de uma investigação do TCU (Tribunal de Contas da União) e fechou contrato de R$ 450 milhões em uma licitação que estava sob apuração da corte por suspeita de favorecimento à empresa vencedora.

O ministro Weder de Oliveira, relator do caso no TCU, havia pedido a suspensão da licitação em que a Calia/Y2 Propaganda e Marketing teve as melhores notas para realizar serviços de publicidade sobre ações do governo.

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A medida cautelar para interromper o processo havia sido tomada por Oliveira no último dia 15 de junho para que os indícios de irregularidades fossem apurados pelo tribunal com maior profundidade e que eventuais danos ao processo fossem evitados.

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Mesmo assim, no dia 21 seguinte, véspera da sessão plenária em que a decisão seria submetida para confirmação ou não pelos demais integrantes do tribunal, representantes da Secom solicitaram reunião de urgência no gabinete do ministro a pedido da AGU (Advocacia-Geral da União), na qual lhe foi informado que o contrato já havia sido firmado no dia 25 de maio.

Em situações assim, não é possível aplicar multa ao órgão por descumprimento da medida porque a finalização da licitação aconteceu quando o tribunal ainda estava analisando as informações recebidas para então decidir se manteria ou não a suspensão do processo.

Na sessão plenária, o ministro se queixou da atitude do governo. Disse que a Secom se omitiu por quase um mês em dar essa informação ao TCU, deixando que a Selog (Secretaria de Controle Externo de Aquisições Logísticas), unidade encarregada da instrução processual do tribunal, concluísse sua instrução sem estas informações.

“A conduta observada (pela Secom) foi oposta à esperada por esta Corte, de prudência e colaboração: o procedimento licitatório foi encerrado rapidamente, na vigência do prazo para manifestação em oitiva prévia, omitindo-se o órgão de prestar a este tribunal essa informação de suma importância, sem qualquer justificativa, tanto para a omissão, quanto para a homologação célere”.

A Secom sabia desde o dia 9 de maio que o certame estava sendo questionado pelo tribunal, mas não forneceu este dado ao processo durante as oitivas do TCU. ​

O ministro acrescentou que tal “conduta reprovável não é usual, mas não é a primeira vez que ocorre”. Ele disse que, em outras oportunidades, out ros relatores do TCU já reportaram situações análogas.

Calia

A denúncia que chegou ao TCU questionando a licitação citava um suposto vínculo conjugal entre a diretora de atendimento da Calia, Alessandra Matschinski, e Peter Erik Kummer, então subsecretário de Gestão e Normas da Secom.

Os técnicos do tribunal lembraram que Kummer foi exonerado da pasta, em publicação no Diário Oficial, um dia antes do caso ser veiculado no portal do Jornal GGN, em 24 de março deste ano.

No ano passado, a Calia foi alvo da CPI da Covid no Senado, que pediu a quebra de sigilo telefônico e fiscal da empresa para apurar se houve dinheiro público destinado às campanhas de comunicação na pandemia usado para financiar sites e plataformas de apoiadores de Jair Bolsonaro que produzem e divulgam fake news.

A Polícia Federal também incluiu a Calia entre as empresas de publicidade contratadas pelo governo investigadas no financiamento e realização de atos antidemocráticos.

Embora estas ações tenham ocorrido em licitações firmadas ainda em governos anteriores, as agências mantiveram os contratos na gestão do ex-secretário de Comunicação do governo Fabio Wajngarten, no primeiro ano do mandato de Bolsonaro.