20 de setembro de 2024Informação, independência e credibilidade
Justiça

Há 35 anos, Bolsonaro, eleito vereador, escapava de condenação por planejar atentado terrorista

Conselho de Justificação Militar (CJM) foi unânime ao considerar Bolsonaro culpado; além de mentiroso, corno, muambeiro, contrabandista e eleitor de Collor

Nesta quarta-feira, 19 de abril, o ex-presidente Jair Bolsonaro completa 35 anos do infame “pede pra sair” que recebeu do Conselho de Justificação Militar (CJM) por simplesmente ter planejado um atentado terrorista.

A punição leve para um crime tão pesado ocorreu porque ele havia sido eleito vereador do Rio de Janeiro, a própria cidade em que ele planejava explodir bombas.

Originalmente, por unanimidade, o CJM considerou, em 19 de abril de 1988, que Bolsonaro era culpado e que sua “incompatibilidade para o oficialato” deveria ser declarada, resultando em sua perda de posto e patente.

Os alvos das explosões de baixa potência, orquestradas pelo então capitão Messias Bolsonaro, seriam quartéis do Exército no Rio de Janeiro, na Vila Militar, na Academia de Agulhas Negras e até na adutora de água Guandu, que abastece a cidade do Rio.

Dois anos antes, em setembro de 1986, Bolsonaro assinou um artigo na Veja afirmando que a tropa vivia em uma “situação crítica em relação aos vencimentos” e que a causa da evasão de mais de oitenta cadetes da Academia Militar eram os baixos salários. Seu descontentamento evoluiu a tal ponto que ele planejou uma operação chamada “Beco Sem Saída”.

Em conversa com a repórter Cassia Maria, Bolsonaro revelou toda a sua operação e como iria explodir bombas no quartel. O diálogo e o rascunho que ele fez com as próprias mãos eram peças centrais de uma matéria, também da Revista Veja, em 1987.

A exposição do plano colocou Jair em problemas com a corte militar. Ele, claro, além de ter mentido sobre não ter conversado com a jornalista, também ameaçou Cassia antes do depoimento.

A matéria completa, sobre a operação ‘Beco sem Saída’, pode ser conferida clicando aqui

Apesar de ter sido acusado de orquestrar um ataque terrorista e vazar informações internas à revista Veja, Bolsonaro foi absolvido em segunda instância. No entanto, ele foi convidado a se “aposentar” das Forças Armadas.

Bolsonaro foi transferido para a reserva remunerada por ter sido eleito para um cargo eletivo, como vereador no Rio de Janeiro, a mesma cidade em que planejava cometer um atentado, e se livrou da condenação.

Jair Bolsonaro não agiu sozinho. A operação teria sido planejada por outro militar, Fábio Passos. O objetivo seria mostrar o descontentamento dos militares em relação ao índice de reajuste salarial prestes a ser anunciado pelo ministro do Exército.

Os três coronéis que investigaram o caso consideraram que:

“O Justificante Bolsonaro mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista VEJA, como comprovam os laudos periciais (…) e revelou comportamento aético e incompatível com o pundonor militar e o decoro da classe, ao passar à imprensa informações sobre sua instituição”.

Na época, o capitão negou tudo. No entanto, uma perícia da Polícia Federal foi inequívoca ao concluir que as anotações nos esboços eram mesmo dele. Investigações posteriores não foram adiante: tudo foi interrompido depois dele ser eleito vereador em 1989.

Jair, portanto, está no mundo da política há mais de 35 anos. E, após mandatos reacionários como deputado federal (período em que passou de admirador de Lula e até mesmo de Hugo Chávez, dizendo que comunismo era coisa do passado), seguiu com seu discurso extremista e foi escalando em popularidade até se tornar presidente da República.

Como presidente, gostava de lembrar o fato de ser “chefe das Forças Armadas”, as mesmas que anos atrás o humilhavam. Em troca, além de vários ministérios e da exaltação da ditadura, o governo Bolsonaro também agraciou os militares com Viagra, próteses penianas e lubrificante.

No entanto, Bolsonaro não conseguiu ser eleito para um segundo mandato. Ciente de que poderia perder democraticamente, namorava a possibilidade de dar um autogolpe e convenceu seus seguidores de que a única saída seria que o Exército ocupasse o governo, com Bolsonaro ainda como presidente.

Para isso, mentiu sobre as urnas eletrônicas e incitou o ódio e a violência na população. O resultado foram algumas mortes de cunho político e a invasão da Praça dos Três Poderes, uma semana após a posse de Lula. Os crimes foram cometidos por seus eleitores.

Jair já havia fugido para os EUA. Voltou recentemente e precisa se explicar, mais uma vez à Justiça, por seus crimes. Desta vez, sem a mamata da imunidade parlamentar.

Leia mais: Bolsonarismo mata: Culto de ódio cria ares de terrorismo e ameaça democracia

Corno e muambeiro

“Além das acusações de planejar um atentado terrorista, o Ministério do Exército também considerava Bolsonaro um mentiroso, corno, muambeiro e contrabandista, além de ser um “eleitor de Collor“.

Estas foram literalmente as impressões de um relatório secreto datado de 27 de julho de 1990 sobre o capitão reformado.

O documento inicia com uma linha do tempo relatando a punição que o capitão Bolsonaro recebeu em 1986, depois de ter assinado um artigo na revista Veja em que pedia aumento de salário.

Também é reconhecido o relatório da Polícia Federal que atesta que a letra do “croqui” que embasou o plano de ataque era do capitão. O Ministério do Exército foi bem detalhado:”

Segundo o relatório, Bolsonaro mentiu ao dizer que não falou com a repórter

 

O tom parte para o ataque e fala das viagens dele para o Paraguai, trazendo muamba, e de problemas no casamento, dizendo que “não passa de um mercenário, corno e contrabandista querendo aparecer”

 

O relatório não deixa de pegar pesado, dizendo que ele precisa “averiguar os passeios de sua então esposa, Rogéria, atingindo até mesmo a honra dela e da esposa do “Major Moraes”

 

Caso queira conferir o arquivo, ele esta no SIAN (Sistema de Informação do Arquivo Nacional) Ou então, basta clicar aqui para conferir o PDF do Gabinete Civil, de 27 de julho de 1990.