A guinada do Brasil nos conceitos de valorização da vida e dos direitos de cada cidadão tem revelado o retrocesso do comportamento humano, que busca no conservadorismo estúpido os argumentos para justificativas de estupros, por exemplo. A edição de hoje do jornal Folha de S.Paulo traz inclusive uma pesquisa que diz que “um terço dos brasileiros culpa as mulheres por estupros sofridos”.
A aberração do pensamento brasileiro em evolução é tamanha que ratifica: “A mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada.”
A pesquisa realizada pelo Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) diz que no Brasil, uma mulher é estuprada a cada 11 minutos, segundo registros oficiais, totalizando quase 50 mil crimes do tipo ao ano.
Estimativas apontam, no entanto, que apenas 10% dessas agressões sexuais sejam registradas, o que sugere uma cifra oculta de até 500 mil estupros anuais.
Ainda segundo a pesquisa do Datafolha, de acordo com dados do SUS (Sistema Único de Saúde), em 70% dos casos de estupro, a vítima é uma criança ou adolescente.
“Trata-se de um déficit civilizatório do Brasil ter tantas pessoas que vinculam a vitimização da mulher a uma conduta moral”, diz Renato Sérgio de Lima, vice-presidente da entidade.
O índice de concordância com a frase que relaciona uso de roupas provocativas com estupro sobe entre moradores de cidades de até 50 mil habitantes (37%), pessoas apenas com o ensino fundamental completo (41%) e com mais de 60 anos (44%).
O índice cai entre aqueles com até 34 anos (23%) e com ensino superior (16%).
“Isso nos mostra uma transformação em curso na tolerância à violência sexual e na percepção de que a culpa é da mulher”, avalia Wânia Pasinato, da ONU Mulheres. “Aqueles mais jovens e com mais educação melhoraram sua compreensão sobre o papel da mulher na sociedade”, diz ela.
O papel da educação no combate às agressões sexuais é reconhecido por 91% dos entrevistados, que dizem ser possível “ensinar meninos a não estuprar”.
“A educação é um fator de mudança e, portanto, devemos trabalhar o potencial transformador de valores das escolas”, destaca Lima.
Para Pasinato, no entanto, a retirada de metas de combate à discriminação de gênero dos planos nacional, estaduais e municipais de educação, por pressão de bancadas religiosas, deve ter impacto negativo nessas transformações.