Ajuda, mas a pessoa não precisa ser religiosa para compreender os mínimos ensinamentos de Jesus Cristo. Interpretando-O como figura bíblica ou histórica, o filho do Senhor, que morreu crucificado aos 33 anos para pagar pelos pecados da humanidade, era a incorporação dos preceitos da felicidade e amor ao próximo.
Seguramente, o completo oposto do pregado pelas igrejas comerciais de hoje, espalhadas pelo mundo, principalmente no Brasil. Isso por causa das pregações priorizando a luta contra o capeta (algumas com prática de exorcismo em público) e escancarados pedidos de dinheiro.
Aparentemente, o dízimo é o mais importante dos preceitos bíblicos. O “amar o próximo como a ti mesmo” é trocado pela pregação ao ódio daquele que é diferente, dos praticantes de outras religiões ou mesmo de outra ideologia. E não nos esqueçamos: livres de impostos.
Pois bem, até Jesus tinha limites: mesmo pregando ensinamentos simples como a busca pela paz (se agredido, ofereça a outra face) ou reconhecimento das próprias falhas (quem não tem uma, que atire a primeira pedra), ele perdeu a paciência. E com fúria divina, expulsou na base dos gritos e do chicote quem fazia de templos religiosos um mercado de negócios.
Corta para hoje, 2021 no ano do Senhor, e o templo reerguido retornou para aquilo que Jesus tanto odiava: agiotas, vendedores de ilusões, irresponsáveis que brincam com a ignorância do povo. Algo biblicamente piorado nesta pandemia, que lota hospitais, mata milhares todos os dias e com alguns pregadores fazendo questão de piorar a situação.
Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus (aquele flagrado em vídeo ensinando como tirar mais dinheiro dos fieis), no ano passado falou em suas pregações ao seu rebanho que ninguém devia se preocupar com coronavírus. ‘Porque essa é a tática de Satanás’.
“Satanás trabalha com o medo, o pavor. Trabalha com a dúvida. E quando as pessoas ficam apavoradas, com medo, em dúvida, as pessoas ficam fracas, débeis e suscetíveis. Qualquer ventinho que tiver é uma pneumonia para elas”. Edir Macedo.
Seja por estar fraco, débil e suscetível (ou, sei lá, por ser assistente do Satanás), há duas semanas Macedo se mandou com a esposa pros EUA e escolheu a dedo a vacina da Johnson & Johnson. Dose única. Eliminou a dúvida. Com seu dinheiro nada suado, fugiu para se vacinar.
Macedo faz parte daquele grupo especial, aliado do presidente Jair Bolsonaro, que conta com figuras como Valdemiro Santiago, Silas Malafaia, e RR Soares. Todos que se uniram para manter as igrejas abertas e cheias em plena pandemia.
Como sustentar seus jatos particulares, manter milhares de hectares de terras e pagar incontáveis horas na TV, se deixar as portas de suas igrejas fechadas? Não vai ter fieis para pagar o dízimo. E como bons adoradores de bens materiais, vender algo para se manter – e fazer caridade neste período – esta fora de cogitação.
Mesmo incentivando a proliferação do vírus, lutaram (e conseguiram) deixar seus templos abertos. Nestas horas, não há Coríntios que faça lembrar que cada corpo é um templo do Senhor e que onde estiver, a pessoa pode rezar e ser ouvida. Mais de três mil mortos pra manter igreja lucrando.
Nos piores momentos, eles apelavam mais ainda. Valdemiro Santiago vendeu feijões mágicos. Por mais de mil reais. Feijões que “curam covid”. E deve ter vendido um monte, pois o líder da Igreja Mundial conseguiu quitar às pressas uma dívida com proprietário de um imóvel em Guararema, a fim de tentar sustar a quebra de seu sigilo bancário.
Ex-bispo da igreja Universal do Reino de Deus, Valdemiro fundou a Mundial em 1998, na cidade de Sorocaba. A igreja diz contar atualmente com cerca de 6.000 templos em 24 países.
A Igreja Mundial do Poder de Deus é a segunda entidade religiosa que mais deve à Receita. Fundada por Valdemiro Santiago, outro ex-pastor da Igreja Universal. A Mundial deve mais de R$ 83 milhões à Receita. Desse total, R$ 5,7 milhões são apenas de contribuições não pagas de FGTS pela organização. Os dados são de 2019.
Agora em 2021, as igrejas tiveram mais de R$ 1 bilhão em dívidas perdoadas. Amém?
Renascer vacinados
Outros dois líderes evangélicos que viajaram para os EUA, na semana passada, para tomar vacina contra a Covid-19 foram Estevam Hernandes, 67 anos, e sua mulher, Sonia, 62. Os líderes da Igreja Renascer em Cristo e da TV Gospel, foram vacinados contra o vírus na Flórida.
Diferente de Macedo, o casal Hernandes (surpresa, também bolsonaristas) não se comportou como negacionista, não falou besteira e nem duvidou da doença. Ou seja: não falou em obra de “Satanás”, como Macedo.
Mas eles mantiveram cultos presenciais nas últimas semanas, apesar do agravamento do contágio. De forma surreal, os fiéis eram obrigados a assinar uma declaração de que estavam cientes da pandemia, e que manteriam distância mínima de dois metros dos demais.
E claro, sem surpresas, não deixaram de tentar persuadir os fiéis da Renascer a manter os pagamentos de dízimos, fazer doações e realizar os “desafios”, uma palavra bonita para incentivar doações extras.
Apesar de já terem sido presos nos EUA, eles cumpriram toda a pena e hoje estão liberados para seu trabalho missionário naquele país.
Ivermectina te amo
Um caso mais irritante é o de Silas Malafaia. O líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo confirmou neste final de semana que está com covid-19. Forte aliado do presidente Jair Bolsonaro (na maior parte do tempo), o pastor se opõe às recomendações das principais autoridades sanitárias, cientistas, acadêmicos e especialistas em epidemiologia.
Ele já fez críticas públicas ao lockdown e a medidas restritivas, com o argumento de que estas levariam a prejuízos à economia. O religioso também é entusiasta de medicamentos sem eficácia comprovada no tratamento da doença, como a ivermectina.
“Eu quero mostrar quem são os verdadeiros negacionistas. Que negam a verdade ao povo. Escondem a verdade. Negam tratamentos que podem ser feitos preventivos. E olha que coisa linda: recebi telefonemas do pessoal da Globo. Estão preocupados comigo? Claro que não. É porque é mais uma notícia. Quanto mais notícia negativa, melhor”. Silas Malafaia.
Até Jesus perdeu a paciência. Justamente contra aqueles que usavam a religião para enriquecer e distorcer as palavras de seu Pai. Estamos em 2021, passando por uma praga já há vários anos.
E caso Ele retorne, é de se imaginar que sua fúria durante a limpeza do Templo se repita. E aqueles incapazes de seguir preceitos simples (como amor e paz) seriam seus primeiros alvos.
