28 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
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A raposa e o galinheiro no país dos absurdos

Como entender que alguém preso por por fraude no exercício de cargo público, pode continuar exercendo mandato representando o povo e criando leis?

Há muito discutida no País, a proposta de reforma do Código de Processo Penal (CPP) brasileiro está entregue a uma comissão especial do Congresso Nacional para ser elaborada e apreciada em plenário. Até aí tudo bem. Aos 77 anos, nosso caduco Código Penal (de 1941) vem sendo remendado e pede atualização mais ampla e definida.

Normal?…

Sim. A anormalidade está mesmo numa situação amorfa – pra não dizer absurda.

Preso desde fevereiro, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado João Rodrigues (PSD-SC) é um dos integrantes dessa comissão encarregada de dar forma ao novo CPP – o Código que estabelece as regras de investigações criminais e ações penais fundamentais para as decisões da Justiça.

Pode, uma coisa dessa?

No Brasil, pode!

O parlamentar foi condenado em segunda instância em 2009 por fraude em licitação quando era prefeito da cidade de Pinhalzinho, em Santa Catarina. Sua indicação para a comissão especial do CPP ocorreu há três anos – em abril de 2015 – e em fevereiro deste ano ele foi preso, após ter recurso negado no STF, que determinou a execução provisória da pena, de 5 anos e 3 meses de prisão.

Na semana passada, a juíza Leila Cury, da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, negou pedido do deputado para que pudesse sair da prisão para trabalhar – na Câmara. Provavelmente preocupado em exercer sua influência de voz e voto na elaboração do novo CPP. Ou, quem sabe, para manter íntegros os seus vencimentos na Câmara Federal.

Sim. Mesmo preso há dois meses, o parlamentar não foi afastado do mandato. E com isso, mantém as prerrogativas vencimentais que lhe garantem remuneração mensal de R$ 33,7 mil mais verbas relacionadas a exercício do mandato – cotas e verba de gabinete, que somam mais de R$ 130 mil.

Normal seria que um deputado preso fosse afastado do mandato. Mas não se pode dizer que o Brasil é um país de normalidades.

Segundo reportagem do G1, a assessoria do líder do PSD na Câmara, deputado Domingos Neto (CE), informou que Rodrigues foi reconduzido às comissões das quais já participava antes de ser preso; que isso é um procedimento comum na Casa (se é!?); e que o processo que resultou na sua prisão não transitou em julgado – ainda cabem recursos.

Ainda segundo a reportagem do G1, a assessoria de Rodrigues argumentou que, mesmo preso, ele não teve o mandato cassado, portanto, faz jus às prerrogativas parlamentares .

Esse Brasil é mesmo o País dos absurdos, sobretudo em se tratando das benesses políticas que transformam, cada vez mais, o nosso sonho de justiça em utopia.

Como entender que alguém preso por por fraude no exercício de cargo público pode continuar exercendo mandato, representando o povo e criando leis?

Quem estaria abonando as faltas para garantir a remuneração do deputado preso?

Será a mesma justiça que condena e manda prender, a que autoriza o criminoso a perceber do erário, como se ele estivesse trabalhando normalmente?

Esse não é o Brasil que queremos…

Mas é o que temos!

Detalhe: O condenado (ops! Deputado) também é alvo de processo no Conselho de Ética da Câmara, instaurado em 27 de fevereiro, cujo relator, o deputado Ronaldo Lessa (PDT), já emitiu parecer – que será analisado nesta terça-feira (24) – favorável à investigação por quebra de decoro parlamentar.

Vem mais bronca…