29 de junho de 2024Informação, independência e credibilidade
Justiça

Voto pode favorecer Lula: STF retoma julgamento de prisão após 2ª instância

Relator ministro Marco Aurélio defende que a pena tenha início só após esgotados os recursos

O Supremo Tribunal Federal retoma na manhã desta quarta-feira (23) o julgamento da constitucionalidade da prisão de condenados em segunda instância com o voto do relator das ações sobre o tema, o ministro Marco Aurélio Mello.

Ele é um dos maiores defensores da tese de que a Constituição exige que se esgotem todos os recursos antes da execução da pena de um condenado.

Desde que assumiu a relatoria das ações, que começaram a chegar ao STF em 2016, o ministro tem indicado que votará por declarar constitucional o artigo 283 do CPP (Código de Processo Penal), segundo o qual ninguém pode ser preso exceto em flagrante ou se houver “sentença condenatória transitada em julgado”.

O código é de 1941. O artigo em questão foi modificado por lei em 2011, em uma tentativa do Congresso de adequá-lo à Constituição de 1988.

O relator liberou as ações para julgamento no final de 2017. A presidente do Supremo na ocasião, ministra Cármen Lúcia, evitou colocá-las na pauta do plenário, o que gerou críticas de parte de seus colegas e, em especial, de Marco Aurélio. Naquela época, a Lava Jato estava na iminência de executar a pena do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que acabou preso em abril de 2018.

Em 19 de dezembro do ano passado, já com Dias Toffoli na presidência do tribunal, Marco Aurélio afirmou que estava havendo demora na apreciação das ações e concedeu uma liminar (decisão provisória) para soltar todos os réus que haviam sido presos por causa de condenação em segunda instância.

A decisão beneficiaria Lula, o preso mais célebre da Lava Jato, e, após contestação do Ministério Público, foi derrubada por Toffoli no mesmo dia.

Na liminar cassada, Marco Aurélio afirmou que a constitucionalidade do artigo 283 do CPP não comporta questionamentos, pois reproduz o princípio da presunção da inocência, cláusula pétrea da Constituição, que diz em seu artigo 5º que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Ministro Marco Aurélio defende que a pena tenha início só após esgotados os recursos

Votos divididos

Como nas vezes anteriores que abordou o tema, o Supremo está dividido: há ministros que defendem a prisão em segunda instância e ministros que entendem que é preciso esperar o trânsito em julgado (quando se esgotam os recursos).

Há ainda uma proposta intermediária feita em 2016 por Toffoli para permitir a execução da pena após o julgamento do recurso no STJ (Superior Tribunal de Justiça), que é considerado uma terceira instância.

A ideia de Toffoli já não afetaria o caso de Lula, condenado pelo STJ em abril deste ano. Essa possibilidade, contudo, tem perdido apoio entre integrantes do Supremo.

Encontro com Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) se reuniu semana passada com três dos 11 ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). No Palácio do Planalto, foram recebidos o presidente da Corte, Dias Toffoli, e os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.

Toffoli e Moraes participaram juntos de audiência com Bolsonaro por 15 minutos e depois compareceram à solenidade em que Bolsonaro assinou Medida Provisória Contribuinte Legal, às 10h15. Gilmar chegou ao gabinete de Bolsonaro às 11h e lá permaneceu durante 25 minutos, segundo agenda oficial do presidente da República divulgada.

Ao longo do dia, Bolsonaro recebeu ministros de Estado e participou de cerimônia fechada para o retorno da emissão de carteirinhas de identificação militar a quem está na reserva.

O encontro com os ministros do Supremo aconteceu um dia antes do que seria início da votação na Corte sobre a prisão em segunda instância. E, curiosamente, a decisão da corte foi adiada para esta semana.

Ainda mais evidente que Bolsonaro e STF estão nos mesmos termos, foi a bronca que ele deu no filho Carluxo, responsável pelas redes sociais do presidente. Em um texto de tom mais forte, o perfil de Bolsonaro cobrava o STF para manter presos em 2ª instância. Mas não só a mensagem teve que ser deletada, como Carlos Bolsonaro teve que admitir ser ele quem controla as redes do pai.

Pressão de Villas Boas

O general Villas Bôas publicou em suas redes sociais alguns comentários belicosos sobre alterações da prisão em 2ª instâncias, às vésperas de o STF retomar julgamento. E atiçou ânimos na corte. Ministros dizem que, desta vez, a chance de a pressão surtir efeito contrário é grande.

No texto, o general cita risco de convulsão social. O general publicou mensagem mais incisiva no ano passado, às vésperas do julgamento de um habeas corpus do ex-presidente Lula. Na ocasião, o voto de Rosa Weber foi creditado à esse gesto dele. E a votação, que ocorreria hoje, foi mudada para a próxima semana, após a reunião de Bolsonaro com três ministros do STF.