28 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Governistas assumem na CPI as duas faces de Bolsonaro: a institucional e a do fanfarrão, mentiroso

Na internet ou ao lado de apoiadores, o presidente “apenas age” como uma criação do gado para o gado e liberado para vociferar impropérios, mesmo com consequências genocidas

Em seu primeiro dia de depoimento na CPI da Pandemia, o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, garantiu que o presidente Jair Bolsonaro nunca o contradisse, enviou ordens ou mandou que ele agisse de forma diferente enquanto chefiava a pasta. Nem mesmo em casos como com a compra da Coronavac ou uso da cloroquina.

Claro, mesmo diante de inúmeros provas em texto e vídeo, como quando um Bolsonaro indignado e aos gritos, literalmente, dizia que vacina chinesa não seria comprada (após Pazuello prometer aos governadores um acordo pela Coronavac) e o patético vídeo em que, com covid-19, o ex-ministro recebe o presidente em casa e fala “um manda, o outro obedece”.

Leia mais: Pazuello volta para a Parte 2 de seu depoimento, após mentir até passar mal na CPI

Pazuello insistiu numa retórica arriscada ao governo: a de uma coisa é o Bolsonaro falando de forma oficial, e a outra é ele falando na internet.

“Bolsonaro nunca mandou desfazer contrato com o Butantan, nunca foi dada essa ordem. Uma ordem pela internet não é uma ordem. Uma ordem deve ser escrita”. Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde na CPI.

Sonso ou muito bem treinado juridicamente, Pazuello insistiu na retórica de que uma coisa é Bolsonaro falando oficialmente e que outra é ele falando para seu público. Ou seja: que o “Mito” não é para ser levado a sério.

Isso foi corroborado inclusive pelo filho 02, o senador Flávio Bolsonaro, que no dia anterior, enquanto tentava defender o ex-ministro Ernesto Araújo, criticou o que chamou de ‘negacionismo do óbvio‘ e aproveitou para reforçar que seu pai nunca chamou covid de “gripezinha”. ‘Apenas no caso dele’.

No caso dele, especificamente, o presidente disse que a Covid seria uma gripezinha. E graças a Deus foi. Mas a narrativa que foi construída é que Bolsonaro]teria dito que todos que foram acometidos pelo Covid teriam uma gripezinha. No meu entendimento, essa alegação é uma fake news”. Flávio Bolsonaro, senador.

Sendo assim, o presidente que biblicamente diz que a liberdade liberta, criou um personagem liberado para atacar instituições, fazer piadas que seriam barradas na A Praça é Nossa, e, essencialmente, ir de encontra à sua posição de presidente da República.

Mesmo que isso signifique, claro, apelar quando estes vídeos “não oficiais” sejam deletados. O governo, por exemplo, já prepara um decreto para limitar a atuação de redes sociais no Brasil e proibir que sites e redes sociais apaguem publicações ou suspendam usuários de suas plataformas.

O decreto é uma resposta do governo à atuação das principais plataformas e, caso seja editado, pode permitir que  a propagação de informações falsas e o discurso de ódio cresça ainda mais. Nos últimos meses, publicações e vídeos do presidente Bolsonaro foram retirados do ar pelo Facebook e pelo Google sob a alegação de que propagavam informações falsas ou sem comprovação.

Mas, para os governistas, o que importa então são os atos, não o discurso. Na verdade, nem mesmo a figura importa. Aquele cara que se parece com Jair Bolsonaro, fala como Jair Bolsonaro e age como Jair Bolsonaro, não é o presidente. É só um personagem.

Na internet ou ao lado de apoiadores, o presidente “apenas age” como uma criação do gado para o gado e liberado para vociferar impropérios, mesmo com consequências genocidas

Sendo assim, tecnicamente, governistas acreditam que se Bolsonaro falou para o gado e viralizou na internet, não pode ser oficial: o que importa é o que ele falou, às portas fechadas, aos seus comandados.

O presidente nunca recomendou cloroquina, por exemplo. Aquele que ofereceu até para a coitada de uma ema era só um babaca fictício, que está liberado para mentir e ofender?

Se for o caso mesmo de ser uma figura não-oficial para internet, estaria então liberado falar mal desta criatura genocida, sem ter que se preocupar com crimes de ofensa ao presidente?

Afinal, aquele não é o presidente, é só um personagem de ficção que busca apenas autorização de seu gado, mas nunca autorizou ou se responsabilizou pelo que fez em seu governo.