26 de abril de 2024Informação, independência e credibilidade
Brasil

Centrão quer R$ 100 bilhões para gasodutos para favorecer ao “rei do gás”

A ideia do “jabuti” vendida pelo deputado Fernando Coelho Filho (UB-PE) ao presidente da Câmara, Arthur Lira, é criar fundo batizado de Centrãoduto

Fundo para a construção de gasodutos no País é o novo “jabuti” do Centrão

O Centrão opera no Congresso Nacional para aprovar um projeto bilionário que prevê a construção de gasodutos no País. A proposta cai como uma luva para viabilizar projetos do empresário Carlos Suarez  (rei do gás) e seus sócios,  – hoje os únicos donos de autorizações para distribuir gás em oito Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Nos planos do Centrão está retirar R$ 100 bilhões do lucro com a exploração do pré-sal que teriam como destino o Tesouro Nacional e direcionar para quitar o custo das obras. O valor se aproxima a tudo o que o governo tem para despesas com investimentos e custeio da máquina pública em 2022.

Desde 2015, já houve ao menos dez tentativas de criar o fundo para bancar a rede de gasodutos, conhecido como Brasduto, por meio de projetos de lei e medidas provisórias. Nenhuma teve êxito. Desta vez, porém, empoderado pelo presidente Jair Bolsonaro, o Centrão acredita que tem voto suficiente para concretizar o plano apelidado no meio político de “Centrãoduto”. Um caminho para isso já foi traçado.

A proposta viabiliza o projeto de Suarez, ex-sócio-fundador da empreiteira OAS. Além das oito distribuidoras no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o empresário possui quatro autorizações para construção de redes de gasodutos. O que ele não tem e precisa é a origem dos recursos que vão bancar os dutos para conectar regiões isoladas, onde vai ter gás, aos grandes centros, onde estão clientes potenciais. Para isso, o empresário e seus sócios precisam do Brasduto.

A articulação prevê que seja incluído um “jabuti” – termo usado para se referir a emendas que não têm relação com propostas originais – no Projeto de Lei 414, texto que trata de medidas de modernização do setor elétrico.

Na semana passada, o relator do texto, deputado Fernando Coelho Filho (União Brasil-PE), teve uma conversa reservada, na qual combinou os termos com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O que está por vir é um “jabuti surpresa”. Durante a votação da urgência do projeto, a emenda surgiria no texto, sem uma análise prévia dos deputados.

‘Centrãoduto’ representa ônus para consumidores, diz associação

As discussões ocorrem nos bastidores, porque o projeto é polêmico. A Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), que tem entre seus membros companhias como Alcoa, Braskem, CSN, Gerdau, Nestlé, Suzano e Votorantim Cimentos, afirma que o “Centrãoduto”, que se conectaria a usinas termelétricas, representa “um ônus elevado para todos os consumidores de energia elétrica, em um desenho ineficiente que cria privilégios para alguns empreendimentos de geração com características muito específicas, em detrimento de um planejamento de contratações baseadas em eficiência e modernização do mercado”.

A entidade reúne mais de 50 grupos empresariais responsáveis por quase 40% do consumo industrial de energia elétrica do Brasil e 42% do consumo industrial de gás natural. Outra crítica partiu do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), principal organização deste mercado e que reúne 27 associações. Em carta enviada ao deputado Fernando Coelho Filho, questiona os jabutis.

“É importante ressaltar os riscos recorrentes que os PLs (projetos de lei) do setor energético vêm sofrendo, com a inclusão dos chamados ‘jabutis’, como (…) a construção de gasodutos subsidiados pelo setor elétrico e/ou pelo Tesouro, com fortes impactos para os consumidores e/ou para os contribuintes brasileiros.”

Suarez era o ‘S’ da OAS

Mais conhecido como o “S” da empreiteira OAS, Carlos Suarez deixou a empreiteira em 1996 e passou a investir no ramo imobiliário, além do setor de gás. Naquela época, as estatais responsáveis pela distribuição canalizada de gás nos Estados tinham começado a permitir a participação de sócios, após uma emenda constitucional que passou pelo Congresso Nacional.

Nos anos seguintes, Suarez montou três empresas – CS Participações, Manausgás e Termogás – e comprou participações nas distribuidoras do Distrito Federal e mais sete Estados: Amazonas (Cigás), Pará (Gás do Pará), Amapá (Gasap) Maranhão (Gasmar), Piauí (Gaspisa), Rondônia (Rongás) e Goiás (Goiasbrás). Com as distribuidoras nas mãos, ele passou a ser remunerado por qualquer companhia que fosse distribuir gás nestes Estados.